Semana On

domingo, 23 de dezembro de 2012

Eles não queriam matar... mas mataram



Eles não queriam matar... mas mataram

Enquanto a lei não for draconiana, combinação álcool e direção continuará matando no Brasil

Clarice da Costa, 56 anos, e sua filha, Camila Turolla, 27 anos, aguardavam um táxi na madrugada do último dia 8, em um dos portões de saída do aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo, quando se transformaram em estatísticas da guerra do trânsito no Brasil. Foram atropeladas pelo assistente técnico Wagner Gomes Alvarenga, 23 anos, que voltava de uma confraternização no serviço.

Clarice morreu e Camila encontra-se hospitalizada em estado grave. Wagner cotizou R$ 12 mil com a família e foi posto em liberdade.  Ao se preparar para ir para casa, disse à imprensa que não teve intenção de cometer o crime, alegou que teve um "mal súbito" após "beber um pouco", pediu perdão.

Também não teve intenção de cometer crime algum o estudante de Direito Richard Ildvan Gomides Lima, 22 anos, que na madrugada do dia 31 de maio ultrapassou em alta velocidade um sinal vermelho na Avenida Afonso Pena, em Campo Grande (MS), matando na hora o segurança David Del Vale Antunes, 31 anos, que voltava para casa após um dia de trabalho. Assim como Alvarenga, Ildvan já está em casa. Foi posto em liberdade esta semana.

Ildvan se negou a realizar o teste do bafômetro na delegacia, apesar das evidências de estar alcoolizado. Os exames toxicológicos mostraram que Wagner tinha uma concentração de 0,28 miligramas de álcool por litro de ar expelido (mg/l), índice pouco abaixo do limite para imputar a ele uma sanção criminal (0,3 mg/l), mas que ainda o impedia legalmente de dirigir. Ambos aguardarão julgamento e, até lá, suas defesas farão o possível para transformar crimes em fatalidades.

Nenhum deles pretendia cometer crime algum dizem os advogados. Ocorre que as coisas não são assim tão simples. O fato é que quem bebe – seja lá que quantidade for – e dirige assume o risco de colocar em perigo a vida de terceiros. Deveria, a priori, ser encarado pela justiça como um criminoso.

De nada adianta o pedido de perdão feito por Wagner diante das câmeras de TV. Perdão não vai trazer Clarice de volta, não vai amenizar o choque de Camila. Nenhum pedido de perdão feito por gente que mistura álcool e direção pode ser levado a sério. Nenhum argumento hipócrita de advogados vai amenizar a dor da família do segurança David.

O Senado brasileiro perdeu uma oportunidade no último dia 12, ao aprovar a lei complementar que aumenta a multa, além da apreensão da carteira de habilitação, como punição para quem for flagrado dirigindo sob o efeito de álcool. O texto aprovado representa quase nada em comparação ao relatório original do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que estipulava "tolerância zero" para associação entre álcool e direção e detenção mínima de seis meses a três anos.

Enquanto a lei não for draconiana contra os que fazem pouco da vida alheia, Clarices, Camilas e Davids continuarão engrossando as tristes estatísticas e confirmando a nossa irresponsabilidade diante da vida.

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