O tratamento que a revista Veja deu nesta semana para o caso da menina pernambucana de 9 anos que passou por um aborto após ter sido estuprada pelo padrasto - e que levou a excomunhão da mãe da menina e da equipe médica que realizou o procedimento - foi elucidativa para analisar o ponto de vista dos que, mesmo diante do anacronismo que representa a imposição de dogmas religiosos sobre uma sociedade laica, insistem em encontrar pontos de apoio para a atitude hedionda do arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho.
O tratamento ambíguo de Veja começa em sua Carta ao Leitor, onde, após explicar que no Brasil a lei “permite o aborto em caso de estupro e quando o feto põe em risco a vida da mãe”, diz que o Arcebispo foi “alvo da fúria dos grupos pró-legalização do aborto em todas as circunstâncias”. Trata-se de uma informação falsa, posta ali com o propósito claro de preparar o leitor para o que viria em seguida, na entrevista das páginas amarelas, onde Sobrinho despejou obscurantismo sobre os leitores do semanário.
Na verdade, ao comunicar a excomunhão da equipe médica e da mãe da menina e não se pronunciar sobre o agressor, o estuprador – este sim merecedor de qualquer penalidade eclesiástica que os donos do saber divino julgassem apropriada – Sobrinho suscitou a ira de gente de todos os credos religiosos, de todos os matizes sociais e raciais e não apenas dos que defendem o aborto em todas as circunstâncias, como quis fazer crer a revista.
Na entrevista – conduzida pela jornalista Juliana Linhares - um Dom José Cardoso Sobrinho acuado, encastelado sob a proteção dos energúmenos, tenta explicar o inexplicável. De início apela para Roma ao dizer que, apesar do maremoto de indignação popular (vinda de todo o mundo) gerada por sua atitude, recebeu o apoio de Giovanni Battista Re, prefeito da Congregação para os Bispos em Roma, de quem teria recebido uma carta elogiosa.
Ocorre que nem mesmo em Roma o gatilho rápido de Sobrinho em aplicar o dogma recebeu apoio incondicional. No sábado, em artigo publicado pelo jornal da Santa Sé, o Osservatore Romano, o presidente da Academia Pontifícia para a Vida, Monsenhor Rino Fisichella afirma que os médicos que praticaram o aborto não mereciam a excomunhão. “São outros que merecem a excomunhão e nosso perdão, não os que lhe permitiram viver e a ajudarão a recuperar a esperança e a confiança, apesar da presença do mal e da maldade de muitos", diz Fisichella.
As barbaridades do arcebispo de Olinda e Recife vão ficando mais evidentes a partir do momento em que ele comenta o nonsense de condenar os médicos e a mãe da menina sem sequer citar o verdadeiro criminoso que estuprou uma criança. Argüido sobre o motivo pelo qual o estuprador não foi excomungado tal qual a mãe e os médicos, saiu-se com esta: “estupro é um pecado gravíssimo para a Igreja, assim como o homicídio. Agora, a Igreja diz que o aborto, isto é, o ato de tirar a vida de um inocente indefeso, é muito mais grave que o estupro, que o homicídio de um adulto. Qualquer pessoa inteligente é capaz de compreender isso.”. É, é preciso ter uma inteligência azevediana para entender o argumento.
Fica claro, ainda, que longe de se preocupar com o bem estar da menina, o objetivo da Igreja Católica representada por Sobrinho é tão somente o de impor sua visão moral aos demais. Quando a jornalista o questiona sobre se a Igreja ofereceu abrigo, sustento material ou mesmo uma eventual família adotiva para as crianças que poderiam ser geradas pelo estupro, o arcebispo mostrou ao que veio: “Repito mais uma vez: essa menina é residente em outra cidade, portanto, em outra diocese. O bispo de Pesqueira foi quem acompanhou tudo de perto.”, afirmou, passando a bola para outro colega de batina e completando numa total abstração da realidade: “E, se acontecesse o parto, a cidade de Alagoinha iria ajudar. A menina não ficaria abandonada”.
Diga-se que Juliana Linhares, dentro do que seria possível diante dos objetivos de Veja com a entrevista, conseguiu acuar Sobrinho em alguns momentos, expondo a ignomínia de seus atos. Ela escavucou o entrevistado para saber se, ao menos, ele tinha algum conhecimento sobre a vida da menina, sobre como era o seu dia a dia na casa onde era molestada. Conseguiu a seguinte resposta: “Com licença, esses detalhes eu não sei. Se alguém tiver interesse, o caminho mais curto é ligar para o padre da cidade de Alagoinha e perguntar.”. Para completar, Linhares lhe pergunta o nome da menina. Mal estar generalizado. O religioso não soube responder.
Sabia apenas que precisava impor a sharia católica sobre uma mãe (de certo desesperada) e uma equipe médica que fez o que pode para atenuar o trauma inimaginável que seria para uma criança de 9 anos parir outras duas crianças geradas por uma violência sem limites.
O tratamento ambíguo de Veja começa em sua Carta ao Leitor, onde, após explicar que no Brasil a lei “permite o aborto em caso de estupro e quando o feto põe em risco a vida da mãe”, diz que o Arcebispo foi “alvo da fúria dos grupos pró-legalização do aborto em todas as circunstâncias”. Trata-se de uma informação falsa, posta ali com o propósito claro de preparar o leitor para o que viria em seguida, na entrevista das páginas amarelas, onde Sobrinho despejou obscurantismo sobre os leitores do semanário.
Na verdade, ao comunicar a excomunhão da equipe médica e da mãe da menina e não se pronunciar sobre o agressor, o estuprador – este sim merecedor de qualquer penalidade eclesiástica que os donos do saber divino julgassem apropriada – Sobrinho suscitou a ira de gente de todos os credos religiosos, de todos os matizes sociais e raciais e não apenas dos que defendem o aborto em todas as circunstâncias, como quis fazer crer a revista.
Na entrevista – conduzida pela jornalista Juliana Linhares - um Dom José Cardoso Sobrinho acuado, encastelado sob a proteção dos energúmenos, tenta explicar o inexplicável. De início apela para Roma ao dizer que, apesar do maremoto de indignação popular (vinda de todo o mundo) gerada por sua atitude, recebeu o apoio de Giovanni Battista Re, prefeito da Congregação para os Bispos em Roma, de quem teria recebido uma carta elogiosa.
Ocorre que nem mesmo em Roma o gatilho rápido de Sobrinho em aplicar o dogma recebeu apoio incondicional. No sábado, em artigo publicado pelo jornal da Santa Sé, o Osservatore Romano, o presidente da Academia Pontifícia para a Vida, Monsenhor Rino Fisichella afirma que os médicos que praticaram o aborto não mereciam a excomunhão. “São outros que merecem a excomunhão e nosso perdão, não os que lhe permitiram viver e a ajudarão a recuperar a esperança e a confiança, apesar da presença do mal e da maldade de muitos", diz Fisichella.
As barbaridades do arcebispo de Olinda e Recife vão ficando mais evidentes a partir do momento em que ele comenta o nonsense de condenar os médicos e a mãe da menina sem sequer citar o verdadeiro criminoso que estuprou uma criança. Argüido sobre o motivo pelo qual o estuprador não foi excomungado tal qual a mãe e os médicos, saiu-se com esta: “estupro é um pecado gravíssimo para a Igreja, assim como o homicídio. Agora, a Igreja diz que o aborto, isto é, o ato de tirar a vida de um inocente indefeso, é muito mais grave que o estupro, que o homicídio de um adulto. Qualquer pessoa inteligente é capaz de compreender isso.”. É, é preciso ter uma inteligência azevediana para entender o argumento.
Fica claro, ainda, que longe de se preocupar com o bem estar da menina, o objetivo da Igreja Católica representada por Sobrinho é tão somente o de impor sua visão moral aos demais. Quando a jornalista o questiona sobre se a Igreja ofereceu abrigo, sustento material ou mesmo uma eventual família adotiva para as crianças que poderiam ser geradas pelo estupro, o arcebispo mostrou ao que veio: “Repito mais uma vez: essa menina é residente em outra cidade, portanto, em outra diocese. O bispo de Pesqueira foi quem acompanhou tudo de perto.”, afirmou, passando a bola para outro colega de batina e completando numa total abstração da realidade: “E, se acontecesse o parto, a cidade de Alagoinha iria ajudar. A menina não ficaria abandonada”.
Diga-se que Juliana Linhares, dentro do que seria possível diante dos objetivos de Veja com a entrevista, conseguiu acuar Sobrinho em alguns momentos, expondo a ignomínia de seus atos. Ela escavucou o entrevistado para saber se, ao menos, ele tinha algum conhecimento sobre a vida da menina, sobre como era o seu dia a dia na casa onde era molestada. Conseguiu a seguinte resposta: “Com licença, esses detalhes eu não sei. Se alguém tiver interesse, o caminho mais curto é ligar para o padre da cidade de Alagoinha e perguntar.”. Para completar, Linhares lhe pergunta o nome da menina. Mal estar generalizado. O religioso não soube responder.
Sabia apenas que precisava impor a sharia católica sobre uma mãe (de certo desesperada) e uma equipe médica que fez o que pode para atenuar o trauma inimaginável que seria para uma criança de 9 anos parir outras duas crianças geradas por uma violência sem limites.
4 comentários:
Barone, reproduzo aqui o texto de MarceloMirisola, um cara que gera controvérsias no meio jornalístico, que é execrado por muitos e admrado por outros. Desculpe a invasão. Bj
Uma Piada e uma lavada de alma
1. Igrejas
Tem alguma coisa fora do lugar quando um sujeito que é bispo da Igreja Católica diz que não acredita no holocausto. De duas, uma: ou o Deus dessa Igreja não existe ou esse Bispo é um nazista filho da puta.
Richard Williamson, o bispo, já havia sido excomungado. O Papa Bento XVI revogou a excomunhão dele e, semana passada – devido à pressão que sofreu e ao fato de ser leitor dessa coluna – resolveu dar satisfações a seu rebanho. Ficou pior a emenda que o soneto. Eu acho engraçado: como é que um cara que foi mandado pros quintos dos infernos por um Papa que já morreu e que, em tese, segundo os preceitos da própria Igreja, é “infalível”... de repente pode voltar do limbo falando um monte de bobagens em nome de uma religião da qual – até semana passada – eu fazia parte?
E o pior. Como é que tem gente que leva esses caras a sério? Por que tanta indignação quando uma besta que usa saias destampa a latrina para falar merda? O Papa e os sacerdotes da Igreja Católica – a meu ver – são tão irrelevantes e folclóricos quanto nossa monarquia. Ou será que alguém – tirando os seguidores da TFP – vai dar bola para as bobagens que o herdeiro do trono real brasileiro tem a dizer?
Imagino que deva existir uma seita em Itatiaia que venera pelos grisalhos de sovaco, seus clérigos acreditam que a pedofilia é o caminho para se chegar aos tesouros dos céus. A vida das criancinhas – para eles – está acima de tudo. Acima até da máquina de lavar roupas, que é uma santa dessa Igreja (essa santa faz milagres e atende pedidos exclusivamente de donas-de-casa). A doutrina deles condena o aborto, condena o homossexualismo e faz sérias restrições com relação a judeus e muçulmanos. Também acreditam num ser iluminado que foi parido do ventre de um tamanduá. O Papa dessa seita mora num condomínio fechado no Vale do Alcantilado. Na garagem de sua mansão ele tem duas BMWs, uma réplica da Demoiselle IV e duas virgens preservadas no interior de um Land Rover. O iluminado também gosta de pescar e, às vezes, reza missas em latim. Ele é o preferido dos cantores sertanejos, usa esmalte incolor nas unhas e não escova os dentes, cultiva paradoxos e serpentes no seu jardim de orquídeas, e tem uma língua afiada e bipartida. Por baixo da batina, Sua Santidade veste uma cinta-liga amparada por ferrolhos que lhe perfuram as coxas. Alguns sacerdotes dessa excêntrica Igreja fazem voto de pobreza, outros colecionam obras de arte. A Igreja do Sovaco Grisalho tem milhares de seguidores no mundo inteiro. Aborto não se discute, se excomunga.
Pois bem, dia desses um arcebispo da Igreja supracitada excomungou um médico que fez um aborto e salvou a vida de uma menina de nove anos que foi estuprada pelo padrasto. Por que ninguém se escandalizou com a atitude desse arcebispo? Só porque ele não era da Igreja Católica Apostólica e Romana?
Esses caras são uma piada.
2. Futebol
Para que time eu torço? Vou repetir pela centésima vez. Torço para o futebol acabar. E já que minha torcida não vai surtir efeito algum, gostaria de me corrigir com relação a Ronaldinho. Não o jogador de futebol, mas o cara que ultimamente passou a levantar a cabeça, dar petelecos nos companheiros do banco de reservas e a fazer piadas nas entrevistas.
Queria falar de um Ronaldinho acima do peso, e mais humano.
Uma das coisas que mais me incomodavam no antigo “fenômeno” era o fato de ele falar aos muxoxos, olhando para baixo ao invés de encarar frente a frente as câmeras e a babação de ovos dos repórteres fofoqueiros. Desde 94 quando – ainda na reserva – ganhou a Copa mais feia da história, passando pela construção do mito, seguida da desconstrução e das cirurgias até o episódio dos travecos, sempre foi assim. Eu pensava comigo mesmo: como é que um cara que olha para baixo, resmunga lugares-comuns, batiza o filho com o nome de Ronald e casa num Castelo com uma Cicarelli da vida, pode prestar para alguma coisa? Não me dizia nada.
Esse papo de garra, vontade e determinação podia servir ao ufanismo do Galvão Bueno, a mim jamais me disse coisa nenhuma. O esporte em geral não tem argumentos que me convençam. Por exemplo, a São Silvestre. Quando era noturna, tinha seu charme.
Agora, debaixo do sol, é uma insensatez. Pensem bem: qualquer fusca modelo 81 – se o trânsito ajudar – faz o mesmo percurso com muito mais rapidez, conforto e civilidade. Por isso que repudiava o futebol que Ronaldinho jogava, por mais espetacular e fenomenal que fosse. Esse “futebol” seguia (e segue) a mesma lógica do Big Brother, a mesma receita da revista Caras: ou seja, transforma gente medíocre em celebridade. E o pior: celebridades que influenciam milhares de pessoas. Quantos incautos frequentam a Igreja da Bispa $onia por causa do Kaká?
Meus parâmetros sempre foram os “bandidos do futebol”. Aqueles que meu amigo Bortolotto queria ver na seleção: Chulapa, Casão, Sócrates, Paulo César Caju, Romário. Mas eu falava do Ronaldinho. Ele voltou não porque foi disciplinado e seguiu a receita do Galvão Bueno, ele não voltou da sessão de hidroterapia nem da aula de neurolinguística, também não foi ungido no altar de uma Igreja obscura e interesseira.
Ronaldinho está em grande forma, quebrando alambrados, virando jogos e fazendo gol no último minuto do segundo tempo, porque voltou da esbórnia. Isso mesmo, voltou da farra! Ele está em grande forma porque está gordo, ele é macho pra cacete porque encara três travecos de uma só vez, ele tem três filhos porque não teve nenhum com a Cicarelli, e para mim – mesmo que a sorte não o favoreça nos últimos minutos do 2º tempo – está bom demais. Só vai ficar faltando mandar o Galvão Bueno para o inferno. Se isso acontecer... é bem capaz que eu diga – da próxima vez que me perguntarem para que time eu torço – que troquei o Palmeiras pelo Corinthians.
* Marcelo Mirisola, 42, é paulistano, autor de Proibidão (Editora Demônio Negro), O herói devolvido, Bangalô, O azul do filho morto (os três pela Editora 34), Joana a contragosto (Record), entre outros.
Isto sim é uma provocação a toda uma história que se chama infância.
Eu li a reportagem, pq sou assinante da Veja e desde que o caso veio à tona, me enojo. Esse, como outros tantos casos de pedofilia e abusos e torturas a uma infância que jamais voltará, como mãe, tenho vontade de parar o trem e descer do mundo....rs
Barone, seus argumentos perfeitos me levam a uma pergunta, a mesma que sempre me faço e que nunca encontro resposta: pra que religião? Pra que templos, e pastores e padres e líderes espirituias? Pra que leis religiosas?
Um verme desse absolve o algoz e condena a vítima com a desculpa que o aborto é crime, pq mata. E como vc bem disse, qual o castigo de um pai que abusava sexualmente de sua filha ( não me venham com essa de padrasto), até o ápice de engravidá-la de gêmeos???????????
Imagine o que essa criança de nove anos passou nas mãos desse homem e por quanto tempo? O sentimento de culpa que uma criança sexualmente explorada carrega é tão grande que raramente na psicanálise há reversão.
Essa criança sente-se culpada por erros presentes relacionados a pessoas que deveriam estar protegendo e assegurando o direito de sua infância.
Ela desenvolve a sexualidade imaturamente o que é outro fator criminoso e de consequências emocionais gravíssimas pela vida.
Enfim, pra que serve um bispo metido a líder religioso com seus dogmas falidos perante uma criança condenada fisica e emocionalmente para o resto da sua vida?
O que o Vaticano poderá fazer por ela?
Talvez, ela encontre pela vida a sorte de achar alguém que tente salvá-la do que restou estendendo a mão e mostrando que ainda pode haver a possibilidade de ser feliz e quem sabe, acreditar novamente nessa raça deplorável....humana.
Uauuuuuuuuuu....fico com os animais!...........rs
Beijo pra vc
.................Cris Animal
Eu sinto pena dele. É uma ignorancia inacreditavel.
"o ato de tirar a vida de um inocente indefeso, é muito mais grave que o estupro"
Sera que ele acha que uma menina de 9 anos consegue se defender de um padrasto?
Barone,
Eu tambpem fiquei indignado com o caso, deixando um artigo no Mausoléu refletindo sobre punição e conforto.
Não deixe de ver também uma pérola que encontrei de nossa história mostrando Como se tratava o estupro no Brasil, em 1833.
Não sou contra a religião, de forma alguma, mas sou contra a forma com a qual ela é executada sobre "o rebanho".
Abraços!
Enviar um comentário