Semana On

quinta-feira, 1 de junho de 2006

Roberto Jefferson 30/09/07

Publicada no dia 30/09/07 no jornal A Crítica

Sem papas na língua

Em junho 2005, quando o então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) deu o pontapé inicial no escândalo do “mensalão”, poucos poderiam prever o violento redemoinho no qual a política brasileira seria lançada. Passados mais de dois anos, a esmagadora maioria dos envolvidos no esquema que sangrava os cofres federais em troca de votos para o Governo Lula na Câmara foi absolvida politicamente. Não escapou, no entanto, de suas responsabilidades legais. No dia 27 de agosto o Supremo Tribunal Federal (STF) acatou por unanimidade a denúncia contra os envolvidos, inclusive Jefferson. Presidente nacional do PTB, o ex-deputado federal desembarcou ontem em Campo Grande, onde tentará conter a migração de políticos do seu partido para o PMDB e aliados. Confira a seguir a entrevista concedida na noite de sexta por Roberto Jefferson ao jornal A Crítica.

Victor Barone

O que o senhor veio fazer no Mato Grosso do Sul?
Prestigiar os companheiros. Mostrar que a direção nacional está ao lado deles. O senador Antonio João tem conduzido o partido com paciência, com serenidade, pegou o partido em uma situação muito delicada e o tem reconstruído tijolo sobre tijolo, pedra sobre pedra, dotando o partido de juventude, de gente boa, compromissada com um ideário positivo em favor do Mato Grosso do Sul, que é um estado que eu amo.

A visita tem relação com o fato de o PTB guaicuru ter perdido vários prefeitos recentemente para o PMDB e seus aliados?
Quero conversar um pouco com o governador André Puccinelli, que foi meu colega na Câmara. Ele tem que parar com isso. Tem que parar com esta história de querer esvaziar o PTB. Não acho que ele esteja agindo corretamente, apesar de respeitá-lo como governador e administrador, ao trocar verbas por transferência de nossos políticos para o PMDB. Isso não é bom para a democracia. Cooptar um homem sem nenhuma motivação ideológica, meramente por troca de vantagens é uma violência contra a democracia. O PTB nacional não está gostando disso. André, meu amigo, não faça isso com o PTB. Nós não merecemos isso.

O que mudou no Brasil após as suas denuncias sobre o mensalão?
A imprensa está muito mais vigilante, mais forte. Tanto é que isso tem incomodado o governo, o governo tem se rebelado contra a imprensa dizendo que ela tem abusado do direito de informar. Graças a Deus a imprensa está cumprindo plenamente seu compromisso constitucional e democrático. Hoje a sociedade brasileira enxerga estas negociações que são feitas no Congresso Nacional com o presidente da República de maneira desconfiada.

Valeu a pena ter “chutado o pau da barraca”?
Valeu a pena. Valeu a pena ver o relatório do ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal. Pois o que mais me machucava era aquela tentativa de desmoralizar a minha palavra, de dizer que eu tinha mentido. Quando o procurador geral da República faz a denúncia e diz que estavam comprovadas todas as acusações do deputado Roberto Jéferson, e eu vejo o Supremo acolher a denúncia por 11 a zero, fico feliz, em paz, com a consciência tranqüila.

Mas o STF também acatou denúncia contra o senhor.
Forçaram a barra. Se você perguntar se eu pratiquei crime eleitoral digo que não tenho dúvida disso. Fizemos uma troca de recursos de partido para partido, de entidade privada para entidade privada, do PT para o PTB, sem declarar à justiça eleitoral. Mas corrupção passiva? O procurador forçou a mão em cima disso. Lavagem de dinheiro? Era dinheiro provado. Não era dinheiro fruto de crime. Forçou a mão, pois foi conduzido duas vezes pelo Lula à Procuradoria Geral e acabou enterrando o governo de cabeça para baixo. Colocou na roda três ministros do governo, o presidente do partido do governo, o secretário do partido, tesoureiro, diretores do Banco do Brasil, o presidente da Câmara dos Deputados, do PT, o líder do PT na Câmara. Ou ele (o procurador geral) renunciava o virava herói. Então, o que ele fez? Ele me atou, tentou apequenar meu gesto. Bateu duas no cravo e uma na ferradura. Empurrou o PT e me enviou junto. Fico amarrado ao José Dirceu.

A política brasileira tem jeito?
A situação não é boa. A união dos partidos não é em favor de um projeto, mas de toma lá da cá. Toma uma diretoria da Petrobras, toma uma diretoria da Eletrobras, toma uma diretoria da Eletronorte. Isso é barganha e do pior gabarito, o que estimula a corrupção no País. Esta troca é muito ruim, desmoraliza a imagem do político nacionalmente. Haja vista a pesquisa feita recentemente pela Associação dos Magistrados do Brasil, mostrando que há uma repugna de 83% da população brasileira sobre a classe política.

Mas tem jeito?É preciso mudar a prática. Temos que ter fidelidade partidária, mais compromisso com o povo. Transformar a união dos partidos em um objetivo claro em favor da educação, da saúde, da segurança pública, do reaquecimento da economia. Deixar claro que estamos focando um projeto de governo para o povo, não pelo toma lá da cá.

O senhor faz uma crítica muito ferrenha sobre a prática política em vigor no Brasil, mas o senhor faz parte desta prática, não há um contra-senso nisso?
A minha posição sempre foi clara neste sentido. Tenho seis mandatos consecutivos de deputado federal. Fui fundador do PTB junto com a Ivete Vargas, em 1979. Fui deputado sempre pelo PTB, nunca troquei de partido. Minha conduta é um exemplo.

O PTB nunca adotou posturas que hoje são alvos de suas críticas?
Claro que sim. Mas não na minha gestão. Quero falar por mim. Não respondo por todos, mas pelos meus atos. Sempre fui PTB. Durante o bipartidarismo, quando tínhamos apenas a Arena e o MDB eu era MDB. Com a volta do pluripartidarismo, em 1979, me filiei ao PTB.

A reforma política sairá do papel?
A reforma teria que ser feita do lado de fora da classe política, pela sociedade, pelo povo. Os políticos jogam pela sua sobrevivência pessoal. Eles não vão fazer a reforma que o povo anseia, que o povo sonha. Seria necessário fazermos um congresso constituinte para escrevermos uma legislação sobre política, vida partidária, vida administrativa do País. Estas pessoas não seriam titulares de mandato, terminado o trabalho voltariam para casa. A fidelidade partidária é importantíssima.

O senhor concorda que o político que abandone um partido pelo qual foi eleito perca o mandato?
Concordo. O Supremo Tribunal Federal vai ditar uma norma sobre isso. Tenho comigo o relatório do procurador geral da República. Ele é contra a cassação retroativa, quer que se estabeleça esta regra daqui para frente. No vazio da lei o Supremo está estabelecendo que quem trocar de partido daqui para frente vai perder o mandato. Isso vai fortalecer os partidos.

Como combater o Caixa 2?
Por que tem caixa 2? Porque quem ganha persegue quem perdeu. As regras têm que ser claras, como na América, onde a economia toca a política. Eleição sem dinheiro não existe. O social passa pelo econômico. O que não pode é a Polícia Federal e a Receita Federal perseguirem empresários ligados a mim. São agentes de estado, não podem se envolver com política. Não é crime doar. O financiamento público de campanha em um País como o nosso é um absurdo. Imagine o povo passando fome, sem remédio e o Estado gastando R$ 10 bilhões com eleição, financiando camiseta, carro de som, panfleto. Não dá.

Como o senhor analisa a crise no Congresso Nacional, protagonizada pelo presidente do Senado, senador Renan Calheiros?
Foi ruim. O Renan arrolou todo o Senado em sua crise pessoal. Ele arranjou uma namorada, fez aquela coisa toda, aquele caso escandaloso, rumoroso, e acabou misturando a sua vida paralela com política, transformando o Senado em um quarto de motel. Foi muito ruim o que o Renan fez, muito ruim.

O senhor tenta retomar sua elegibilidade na justiça, acha que isso será possível?
Vou aguardar, não tenho como mudar uma decisão tomada na Câmara. Tenho um processo na justiça para tentar anular esta decisão. Creio que é muito difícil hoje a justiça devolver por uma sentença o mandato que me foi tomado pela cassação. Mas em 2014 estou de volta.

O senhor arrolou o presidente Lula como testemunha neste processo. Acredita que ele confirmará o que o senhor já afirmou diversas vezes, que avisou a ele sobre o mensalão?
Arrolei sim e ele já confirmou. Apresentei um requerimento na Casa Civil, cujo prazo de resposta se esgota na próxima semana, indagando do presidente quais as medidas que ele tomou a partir de janeiro, quando eu o informei da existência provada e comprovada do mensalão. Quero saber que atitudes ele tomou na prática. Ele vai confirmar. Ele já disse isso à imprensa. Ele não pode fugir à verdade em seu depoimento.

Como está a candidatura do ex-presidente Fernando Collor de Melo a presidência da República?
Temos sonhado com uma candidatura própria do PTB e o nome que temos hoje é o do Collor. Tenho conversado com ele, está um pouco arredio, mas é um bom nome. Gosto muito dos homens que tem erro, pois eles sabem que não podem errar de novo e o povo sabe disso também. É uma maneira do Collor se reencontrar novamente com a opinião publica e enfrentar seu sofrimento passado. Ele tem muita chance de empolgar o eleitorado brasileiro.

O brasileiro é um povo omisso?
Não, é um povo extremamente atento e participativo. Se você pergunta se ele não é violento, graças a Deus digo que não. Mas é um povo que sabe dar suas respostas e tomar suas iniciativas. O Brasil tem um povo bom, consciente e preocupado com seu destino.

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