Semana On

quinta-feira, 1 de junho de 2006

Roberto Freire 15/03/04

Publicada no dia 15/03/04 no jornal O Estado de Mato Grosso do Sul

Uma reforma política sem danos à liberdade individual
Presidente do PPS defende reforma polícia sem fidelidade partidária


Victor Barone

Em visita a Campo Grande na sexta-feira passada, onde lançou o livro "Coerência e Mudança" e proferiu palestra sobre o governo Lula e as eleições municipais, o presidente do Diretório Nacional do PPS (Partido Popular Socialista), Roberto Freire, falou a O Estado sobre a reforma política. Freire defende a lista fechada (na qual a grosso modo o eleitor vota no partido e não no candidato) e o financiamento público de campanha. Apesar de apoiar estes pontos, o deputado é contra a fidelidade partidária, um dos pontos fundamentais da reforma, por considerá-la um "resquício da ditadura". A respeito da política de alianças do partido, Freire disse que ela será a mais ampla possível, respeitando as características de cada região. No entanto, afirmou que, em Campo Grande, dificilmente o PPS estará ao lado do PT.

O senhor está participando diretamente das discussões sobre a Reforma Política na Câmara Federal. Qual a sua avaliação sobre o tema?
A Reforma Política é um tema polêmico, inclusive para os partidos de esquerda. Avalio que o texto do relatório da Reforma Política, aprovado na comissão especial da Câmara, avançou muito em relação ao que foi acatado pelo Senado Federal. Os senadores deixaram as mesmas imposições do período autoritário. Mas ainda falta muito para se chegar à liberdade partidária ideal, há muito defendida pelo PPS. Consideramos que toda e qualquer interferência do Estado sobre o exercício da cidadania é condenável. Nada de fidelidade partidária ou domicílio eleitoral. Trata-se de uma tutela do Estado. Considero que a liberdade partidária tem que ser a mais plena liberdade da cidadania. Por isso, defendo o fim da fidelidade partidária. Isso é um entulho da ditadura. Muito usado quando o partido político era um instrumento do Estado. Isso acabou com a eleição de Tancredo Neves no colégio eleitoral. Defendo o financiamento público e exclusivo das campanhas eleitorais. De acordo com cálculos da Comissão Especial da Reforma Política, o País gastaria cerca de R$ 815 milhões para financiar cada eleição. Acho que o Estado deve arcar com esse custo. A pergunta é se o Estado quer dar transparência à eleição dos parlamentares ou prefere o financiamento de caixa dois, em que a eleição torna-se um antro onde proliferam os Waldomiros Diniz da vida. Também sou adepto da lista fechada (na qual o eleitor vota no partido e não em candidatos individuais) e não concordo que este mecanismo favoreça aos caciques partidários, como tem sido alegado. Sem prazo de filiação, o exercício da cidadania fica livre numa convenção partidária, por exemplo. Aqueles que quiserem podem postular uma vaga na lista partidária.

Quais as estratégias eleitorais do PPS para as eleições municipais de outubro?
O PPS deixou de ser um partido nanico e agora é um partido de porte médio. Vamos lutar para conquistar cada vez mais espaço no cenário político e, principalmente, aumentar o número de prefeitos e vereadores nas eleições de outubro. A nossa expectativa neste ano é a de lançar pelo menos 1.300 candidatos a prefeito, representando um aumento de mais de 50% no número de candidatos em relação ao processo eleitoral municipal passado, onde o partido conquistou 180 Prefeituras. A determinação do partido é a de possibilitar o maior número possível de alianças e lançar candidatos em todos os municípios com mais de 20 mil eleitores. Queremos ampliar a nossa atuação e vamos articular o maior número de alianças.

Que partidos estão dentro do espectro de alianças do PPS?
Essas alianças devem ser articuladas com todos os partidos do campo democrático, entre eles o PMDB, PSDB, PT, PSB e o PDT. A resistência maior fica apenas nas alianças com o PL e do PFL, já que temos divergências nas diretrizes políticas com estas legendas. Todas as articulações e as possíveis alianças serão avaliadas pelos diretórios estaduais. Nas alianças, temos que respeitar a realidade de cada região.

Em Mato Grosso do Sul, então, o PPS está liberado para fazer alianças com o PT?
A orientação para Mato Grosso do Sul é a mesma. Tenho certeza que as nossas lideranças no Estado estão conduzindo este processo da melhor forma. De qualquer forma, acho difícil uma aliança com o PT em Campo Grande. O partido aqui é oposição, já tivemos a experiência de estar ao lado do PT e não deu resultado.

Qual a sua avaliação a respeito dos primeiros meses do Governo Lula?
Positiva, mesmo com algumas preocupações, que acredito que sejam de muitos. Não por achar que o fato de nada ter mudado na condução da política econômica signifique rendição, ou o não-cumprimento de promessas de campanha. Isso é muito mais fruto de uma prudência, o que é correto. Mas é um governo de esquerda, que não pode ficar satisfeito com os elogios do sistema financeiro nacional ou internacional. Era importante não ter a oposição imediata desses setores. Mas a preocupação é que essa prudência não seja exagerada. Não podemos ficar imaginando que alguém veio para o governo para mudar, ter projeto nacional de desenvolvimento, e possa seguir com o continuísmo, atendendo a interesses do sistema financeiro, inclusive internacionais. O PPS foi o primeiro a criticar a condução político-econômica de Lula, em maio do ano passado, e até agora o governo não alterou essa condução. O governo tem que tomar um pulso porque a economia não pode viver pelo humor do mercado.

O PPS participa diretamente do Governo. Esta presença física no cerne da máquina está sendo positiva para o partido?
Todos os ministérios foram prejudicados pela política de austeridade que o governo adotou, que fez um contingenciamento muito forte. Há uma grande contenção de despesas, o que tem provocado críticas sobre uma certa inércia do governo. Espero que, com mais folga, com a recuperação nas contas públicas, isto mude em breve. Mas o Ciro (Ciro Gomes -Ministério da Integração Nacional) é um dos quadros mais bem preparados deste governo. Ele tem tentado ser um bom interlocutor. Tem tentado ajudado na formulação de propostas. Mesmo mantendo seu espírito crítico, que não deixará de exercitar, tem sua velha concepção reformista, que entendeu, talvez até antes do governo Fernando Henrique, já em nossa campanha de 1989, que o Estado brasileiro teria de sofrer uma profunda reforma. Nós falávamos isso e continuamos falando o tempo todo. Por isso, estamos à vontade quando se discute o processo de reformas. Estamos preparados para debater e com espírito crítico para apresentar alternativas, se houver necessidade. É preciso ressaltar a atuação do Ciro. Apesar das limitações, ele está conseguindo desenvolver um importante trabalho. No entanto, hoje, o governo está prejudicando a atuação do ministério, pois ele está impedido de atuar em importantes e decisivas ocasiões, entre elas, as enchentes que ocorreram em todo o país, onde a União acabou sendo omissa. É preciso uma atuação maior da União para tentar resolver esses problemas e, dessa forma, fortalecer o trabalho do Ministério da Integração.

Sem comentários: