Ramez pode unir o PMDB no Senado
Presidente do Congresso Nacional avalia o momento político do Estado e do País
Victor Barone
O Senador Ramez Tebet tem 40 anos de vida pública. Atuou como promotor e professor universitário. Iniciou sua vida política em Três Lagoas, onde foi prefeito. Foi também deputado constituinte, vice-governador e governador do Estado. Em âmbito federal foi ministro e hoje preside o Senado Federal. É de suas mãos que Luiz Inácio Lula da Silva receberá a faixa presidencial no dia 1º. Confira em entrevista exclusiva o que pensa este homem que, hoje, simboliza a força política de MS.Como o Sr. avalia o trabalho do Congresso Nacional neste ano?
O trabalho está retratado pelo número de projetos realizados e aprovados, alguns muito importantes como o fim da imunidade parlamentar em crimes comuns, as novas regras para as medidas provisórias, as leis de proteção à mulher e reformas no campo da saúde, como as leis que favorecem e ampliam o atendimento no setor.
O Sr. assumiu a presidência do Senado em um momento de crise e conseguiu apaziguar a Casa mostrando liderança. Foi uma caminhada difícil?
A maneira como eu assumi a presidência em setembro de 2001 foi um desafio. Conseguimos contornar a crise e, imediatamente, a Casa foi pacificada. Em 2002 o trabalho foi grande. Tivemos a eleição e neste período a votação de projetos diminuiu, mas o Senado continuou funcionando. O país passou por um momento muito frutífero, pois a eleição é o primeiro passo da democracia. Agora encerramos o ano com as leis orçamentárias e participando de um processo de transição inédito na vida nacional.
Qual a participação do Legislativo neste processo?
Muita gente entende que o processo de transição ocorre apenas entre o executivo atual e a equipe do futuro governo. Na verdade o legislativo teve uma grande participação ao destinar recursos para o programa de combate à fome e na votação da mini-reforma tributária, tudo de comum acordo com o novo governo. Outro assunto polêmico que agitava o mercado financeiro, a aprovação do novo presidente do Banco Central, também foi aprovado em tempo recorde.
No entanto às reformas tributária, trabalhista e previdenciária não foram votadas.
Estas reformas são o desafio do próximo governo. Elas são tão importantes para o país que esta legislatura não conseguiu realizá-la, pois, para serem aprovadas, contrariam interesses. O futuro presidente, no entanto, terá a legitimidade necessária para dar andamento a este processo. Mas terá que fazê-lo no primeiro ano de governo, quando estará ainda sob o peso desta legitimidade popular. Se não fizer as reformas já no primeiro ano, elas se tornarão mais difíceis.
No que as reformas devem mexer para criar um panorama mais positivo para o Brasil?
A reforma previdenciária, por exemplo, é muito importante. Há um déficit muito grande. Há um rombo que precisa ser corrigido respeitando direitos adquiridos, mas alterando regras. A reforma tributária precisa alcançar os grandes, porque a classe média e o assalariado são os que mais pagam impostos. Precisamos de uma tributação maior para quem ganha mais. Hoje, as 530 maiores empresas do Brasil praticamente não pagam impostos. São as brechas que a lei brasileira apresenta. Precisa pagar menos quem ganha menos, e mais quem ganha mais. A reforma política, por sua vez, precisa fortalecer a representação popular, através do voto distrital misto. Através dele o eleitor será mais próximo de quem ele elege e todas as regiões seriam representadas. Tenho que frisar também que avançamos muito no processo eleitoral. Em relação às leis trabalhistas, o futuro governo tem um projeto de lei que flexibiliza a legislação trabalhista. É preciso analisar a questão como um todo, e não por partes, facilitando o relacionamento entre capital e empregados, sem comprometer direitos já adquiridos.
Mas estas reformas ficaram emperradas em parte pela oposição do próprio PT.
Houve oposição do PT nestas reformas. Mas o partido tem dado mostras de que, quando está no poder, a situação muda de figura. A própria composição do ministério do futuro presidente mostra isso.
O que o Sr. achou da formação do Ministério?
O ministério é eclético. Salvo um ou outro nome, na minha opinião ele agrada. Estou surpreso, no entanto, com o aumento do número de ministérios quando se tem que enxugar gastos. Alguns deles são de utilidade duvidosa, como o Ministério da Pesca. Não sei se haveria necessidade de um ministério para cuidar da pesca no Brasil, se já tínhamos uma superintendência. Mas estes são apenas sintomas. Vamos aguardar e ver se, na prática, este aumento de ministérios vai resultar numa maior agilização da máquina.
O Sr. considera que MS foi desprestigiado por Lula ao ficar fora do Ministério?
Não acho que houve desprestígio. Não se escolhe ministério por Estado. Mas, é claro que gostaria que MS tivesse sido pleiteado com um ministério.
Sem representantes no primeiro escalão, Mato Grosso do Sul terá que contar como nunca com o trabalho da bancada federal. O senador Delcídio do Amaral (PT) e o deputado federal Vander Loubet (PT) já acenaram com possibilidades de parceria. Haverá entrosamento?
É preciso compreender a nova realidade das urnas. Elas apontam para caminhos que buscam resultados práticos. Devemos estar unidos no interesse de MS. Acredito que é nosso dever buscar recursos para o Estado, a despeito de ideologias e partidos. Tanto por parte da bancada como por parte do governo, todos já perceberam que sem união não vamos a lugar nenhum. Cada um tem que ter suas posições políticas, mas elas devem convergir em interesse do Estado.
Muito se falou durante a eleição na necessidade de aumentar os recursos do Estado através de mudanças no FPE (Fundo de participação dos Estados) e na renegociação da dívida. O Sr. acha que isso ocorrerá no governo Lula?
Esta matéria é difícil de resolver. Acho que MS é muito injustiçado no repasse do FPE, mas para mudar isso é preciso uma emenda constitucional. Quem ganha mais não quer dar uma fatia do bolo para quem ganha menos. Só é possível com uma reforma tributária. Vamos desenvolver o país eliminando as desigualdades regionais. Em relação à dívida do Estado, em termos isolados a negociação é difícil. É preciso que haja uma diminuição dos percentuais pagos. Tem Estado que paga 13% da sua receita, isso tem que diminuir. O vice-presidente José Alencar tem um projeto em andamento que limita este percentual. É possível, com vontade política, e através do pacto federativo.
E a relação entre Congresso e Governo? O Sr. acredita que, passada a lua de mel, haverá uma parceria?
Noto que no Congresso há uma tendência de colaborar com o novo governo. Mas acho que o Congresso deve colaborar com independência, sem servilismo. O que esta em jogo é os interesses do Brasil. Nunca houve tanta esperança e expectativa do povo em relação a um governo. Não podermos decepcionar a sociedade, sob pena de criarmos um descrédito geral no país, um desânimo. Esta esperança não pode ser apagada.
E como se comportará o PMDB fora do governo?
Alijado do poder, sem fazer parte do governo, o PMDB não tem outra alternativa a não ser a de adotar uma posição de independência no Congresso. Na política brasileira não cabem mais oposições norteadas pelo radicalismo. Eu nortearei minha atuação com uma pergunta apenas: é bom para o Brasil?
O Sr. disputará a presidência do Congresso Nacional?
Tenho sido estimulado a disputar a presidência da Casa por muita gente que reconheceu meu trabalho. No entanto, meu partido já tem dois candidatos (José Sarney e Renan Calheiros) e a questão da presidência do Senado deve ser decidida primeiro dentro do partido. Se meu partido quiser apreciar meu nome, tudo bem. Mas eu sinto mais apoio em torno de meu nome em senadores de outros partidos do que no próprio PMDB. Por outro lado, tenho em mente que recebi do povo sul-mato-grossense a maior votação que um político já teve no Estado. Portanto, esteja no cargo que estiver, vou dar tudo de mim para defender o MS e honrar a confiança da população. Se tivesse que escolher um lema, ele seria: servir ao Brasil servindo Mato Grosso do Sul.
O Sr. está inserido em um momento marcante na história da democracia brasileira. Irá empossar o presidente Lula. Qual a importância do ato para o Sr., para MS e para o Brasil?
Para mim é uma honra. Tenho muita emoção e muito orgulho de estar presidindo o Congresso Nacional neste momento histórico para o Brasil. O momento de maior esperança da história de nossa república. Como presidente do Congresso Nacional, vou cumprir este meu dever como um tributo a Mato Grosso do Sul. Se não fosse o Estado não estaria aqui.
A democracia brasileira está amadurecida?
O Brasil está se transformando em um país muito especial e a eleição do Lula demonstra isso. Somos uma democracia muito forte, com instituições fortes. Isso nos ajuda no contexto das nações, inclusive para negociar os interesses do Brasil.
O Sr. inicia agora mais um mandato no Senado. Qual o seu futuro político? O que o Sr. deseja?
Almejo continuar trabalhando. Tudo o que fiz na vida foi resultado de um trabalho árduo. A Bíblia já diz: esforça-te e te ajudarei. Tudo foi conseqüência de muito trabalho, muito amor à causa publica. Quero continuar meu trabalho aqui na Casa com paz de espírito.
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