Semana On

quarta-feira, 30 de maio de 2018

Fahrenheit 451 - Ray Bradbury

“Quem sabe quem poderia ser alvo do homem lido?”

Em 1933, quando os nazistas queimaram em praça pública livros de escritores e intelectuais como Marx, Kafka, Thomas Mann, Albert Einstein e Freud, o criador da psicanálise fez o seguinte comentário a seu amigo Ernest Jones: “Que progressos estamos fazendo. Na Idade Média, teriam queimado a mim; hoje em dia, eles se contentam em queimar meus livros”. Ele não poderia saber sobre o que viria, mas a sutil ironia cai como uma luva para a distopia criada pelo escritor norte-americano Ray Bradbury em 1953. 

Em Fahrenheit 451, Bradbury percebe o nascimento de uma forma mais sutil de Totalitarismo, para além do fascismo: a indústria cultural, a sociedade de consumo e seu corolário ético — a moral do senso comum. A ideia de que existe uma ditadura da maioria, que pune o diverso, o diferente.

Na obra, Bradbury recorreu a uma simbologia simples para retratar o método de censura ideológica em sua visão opressora do futuro. Todos os livros são proibidos numa sociedade na qual ter opinião própria é uma conduta antissocial e criminosa. Os homens finalmente encontraram uma maneira de viver em “paz”, mas sob um alto custo: acabar o pensamento crítico, subjugar a diferença, deter as ideias. Para isso, os livros são banidos por serem fonte de melancolia, revolta, tristeza, dúvida. 

-

“— Me deixe em paz — disse Mildred. — Eu não fiz nada.
— Deixar você em paz! Tudo bem, mas como eu posso ficar em paz? Não precisamos que nos deixem em paz. Precisamos realmente ser incomodados de vez em quando.
Quanto tempo faz que você não é realmente incomodada? Por alguma coisa importante, por alguma coisa real?” 

- 

No mundo de Fahrenheit 451, as pessoas têm todo o tipo de conforto, com programas de TV interativos – na verdade um tipo de mistura de realidade virtual com reality shows proposta por Bradburry décadas antes do surgimento da internet e dos Big Brothers da vida. Este conforto, no entanto, serve como uma anestesia social, uma droga alienante que condena todos a uma pseudo felicidade vazia de conteúdos e questionamentos.

O personagem principal, Guy Montag, trabalha como bombeiro. Mas os bombeiros, nesta distopia, não atuam mais para conter incêndios, mas para incinerar livros escondidos nas casas daqueles que insistem no conhecimento. Tomado por uma sensação de vazio existencial e pela curiosidade em descobrir o que há de tão ruim nos livros, Montag é seduzido pelas riquezas de seus conteúdos. Logo, ele começa a agir de forma diferente do padrão aceito e uma implacável perseguição terá início. 

- 

“Encha as pessoas com dados incombustíveis, entupa-as tanto com “fatos” que elas se sintam empanzinadas, mas absolutamente “brilhantes” quanto a informações. Assim, elas imaginarão que estão pensando, terão uma sensação de movimento sem sair do lugar. E ficarão felizes, porque fatos dessa ordem não mudam. Não as coloque em terreno movediço, como filosofia ou sociologia, com que comparar suas experiências. Aí reside a melancolia.” 

-

Qualquer similaridade com a sedução das redes sociais e o bombardeio inclemente de informação da atualidade não é mera consciência...
Muitas obras de Bradbury foram adaptadas para cinema e TV –o escritor chegou a produzir roteiros diretamente para esses meios. "Fahrenheit 451" foi filmado em 1966 pelo diretor francês François Truffaut (1932-1984).

Sem comentários: