Semana On

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

"Kyoto" - Yasunari Kawabata

Ainda não havia tido contato com a literatura japonesa. Muito elogiado por meu amigo e literato Luiz Carlos Capssa Lima, o escritor Yasunari Kawabata (de quem já se disse que “pintava as palavras”) ajudou-me, por meio de um de seus livros, a debutar neste estranho e delicado ambiente. A obra escolhida foi “Kyoto”, publicada em 1962, seis anos antes de Kawabata ter sido laureado com o Prêmio Nobel de Literatura (o primeiro japonês a receber o prêmio).

A linguagem proposta pelo autor é intrigante, uma prosa poética repleta de sentidos. Contido, despojado, econômico nas palavras, Kawabata consegue transmitir profundidade e extrema beleza ao contar a história de Chieko, protagonista do romance que se passa na cidade de Kyoto, ainda sob o trauma da ocupação norte-americana logo após a segunda grande guerra mundial.

Abandonada quando bebê, Chieko é filha adotiva de um fabricante de quimonos, Takichiro Sada, que vê a decadência de sua loja diante da ocidentalização do Japão. Num passeio pelo interior, na aldeia de Kitayama, surge um encontro acidental entre Cheiko e sua irmã gêmea Naeko. A partir de então, as duas tentam uma aproximação, embaladas pelo destino que constantemente as surpreende.

Dentro deste contexto pouco ambicioso, Kawabata constrói uma narrativa onde os grandes protagonistas não são as pessoas, mas a natureza e a cultura japonesa, que juntas formam um ideal de beleza e de tranquilidade que já começava a ser perdido devido a ocidentalização do país.

A obra é recheada por momentos de lirismo contemplativo – fruto do neo-sensorialismo shinkankakuha ("Sensações Literárias"), corrente da vanguarda literária japonesa – na qual as flores, as árvores e a natureza parecem estar mescladas ao modo de vida das pessoas que delas se acercam. Também faz parte desta costura as detalhadas descrições dos festivais e comemorações seculares de Kyoto e a resistente tradição da confecção dos quimonos e obis.

A singeleza da narrativa de Kawabata tem base na tradição zen-budista. É o que o próprio autor insinuou no discurso pronunciado durante a cerimônia do Nobel, quando fez uma viagem às tradições que o formaram citando poemas de monges budistas.

Disse ele: "Ao contemplar a beleza da neve, da lua cheia, das cerejeiras em flor, isto é, quando despertamos ante as belezas das quatro estações e entramos em contato com elas, quando sentimos a felicidade de termos nos encontrado com a beleza, é quando mais pensamos em quem amamos e desejamos compartilhar com eles essa felicidade",

Sobre o autor

Yasunari Kawabata nasceu em Osaka, em 1899. Ganhador do Nobel de 1968, é considerado um dos representantes máximos da literatura japonesa do século 20. Kawabata estudou literatura na Universidade Imperial de Tóquio e foi um dos fundadores da Bungei Jidai, revista literária influenciada pelo movimento modernista ocidental, em particular o surrealismo francês. Desgastado pelo excesso de compromissos, doente e deprimido, Kawabata suicidou-se em 1972.

2 comentários:

Anónimo disse...

Amigo Victor!
Ler Kawabata é realizar uma viagem ultra sensorial, que tu e outros poetas que te acompanham no Blog,não poderiam se furtar.
É "Outros Sentidos"!!!
Grande Abraço
Luiz Carlos Capssa Lima

Barone disse...

É verdade cacho. Trata-se de uma prosa poética de primeira qualidade.