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segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Adeus Robinson e outras peças curtas - Júlio Cortazar

“Adeus Robinson” foi originalmente escrito por Júlio Cortazar para o rádio (ouça aqui). A peça traz de volta à ilha de Juan Fernández o britânico Robinson Crusoé e seu companheiro “selvagem”, sexta-feira. Palco para que Cortazar construa uma análise sobre a solidão humana – “não há lugar para os náufragos da história, para os senhores da poeira e da fumaça, para os herdeiros do nada” - a peça foi definida por Fausto Wolff como uma “pequena obra-prima”.

O texto compõe o livro “Adeus Robinson e outras peças curtas”, publicado postumamente em 1995, que traz também as peças “Peça em Três Cenas” e “A Temporada das Pipas”, ambas escritas entre 1948 e 1950, e “Nada para Pehuajó”, desenvolvida pelo autor nos anos 70.

O primeiro texto traz o teatro do absurdo como referência, “idéias colocadas no palco onde, certamente, pensava o autor, poderiam ser melhor julgadas em seu experimentalismo no qual é bastante visível a influência do teatro de Jean Cocteau”, sintetiza Wolff. De fato, há em “Peça em Três Cenas” momentos de extrema poesia entrecortados a um conjunto lisérgico. O conjunto, propriamente dito, se perde em meio aos momentos entrecortados de lirismo.

Ninguém deve abrir as luas. Dentro delas ou está o horror ou está o nada, mas às vezes lá dentro existem cachorros ou seres disformes que atacam porque não esperavam ser descobertos”.

A noite vai durar até as cinco e cinqüenta e cinco, e depois começa esse trapo sujo que também chamam amanhecer”.

A luz é livre para andar por onde quiser

...pobres dos que acreditam ainda ser os de antes...

Em “A Temporada das Pipas”, Cortazar continua trafegando pelo teatro do absurdo em um cenário campestre habitado por personagens improváveis e momentos de poesia explícita.

O senhor ordena: ‘a partir de amanhã os girassóis deverão ser azuis. Todo girassol amarelo será decapitado’”.

Aquilo que se diz cria asas. E então...

Não gosto deste caminho. Não sei se andamos por ele ou se é ele que anda por nós

A normalidade é uma coisa muito sobrenatural

A terceira peça do livro, “Nada para Pejuahó” tem lances kafkanianos e também trafega pelo mesmo clima que as duas primeiras, tendo, ainda, na comédia um pé bem fincado ao analisar “a louca obstinação da classe-média lutando por valores que lhe foram impostos e dos quais não pode e nem quer se livrar, na medida em que confunde o real com o verdadeiro, a ponto de perder de vista o fim que lhe dá significado”, para continuar citando Wolff.

Mas o senhor tem certeza de que sabe o que é isso? Todos falam muito do dever... Sempre usam essa palavra quando causam mal a alguém, ou quando causam ma a si mesmos...

Considerado um dos autores mais inovadores e originais de seu tempo, mestre do conto curto e da prosa poética, Cortazar nasceu em Bruxelas, Bélgica, em 26 de agosto de 1914. Sua família viveu na Suíça até o final da guerra, quando retornou à Argentina. Opositor do peronismo, abandonou o país em 1951. Mais conhecido no Brasil pelo seu romance “O Jogo da Amarelinha” (1963), faleceu de leucemia em 12 de fevereiro de 1984.

4 comentários:

Katrina disse...

AMO CORTÁZAR!

Infelizmente, procuro esse livro e nunca encontro, acho que quase raro não? Talvez com mais sorte, encontro em sebos. Por ora, me contento com o último round para terminar de ler.

Barone disse...

Encontrei em um sebo, em Bonito - MS.

Adriana Godoy disse...

Barone, bom encontrar esse artigo sobre o Cortázar. Sempre gostei dele, pelo inusitado, pela criatividade, pelo absurdo realismo...foi um dos primeiros autores que gostei de fato. Esse livro, infelizmente, foi surrupiado de minha estante. Nunca mais o vi, nem achei em sebos...Mas pelo menos senti o gostinho de revê-lo aqui. Ótimo artigo. Beijo.

Barone disse...

Que bom Adriana, que você reviveu o prazer de ler Cortazar aqui. Beijão poetisa.