Semana On

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Somos obrigados a aceitar o catolicismo como religião oficial?

O Knesset (Parlamento de Israel) aprovou inicialmente uma lei que punirá com um ano de prisão os cidadãos israelenses que negarem o direito de Israel de existir como um Estado judaico, segundo o diário Haaretz. É como se o governo brasileiro tenta-se obrigar todos os cidadãos – e os punisse com prisão caso negassem - a adotarem o catolicismo como religião oficial do Estado, independente de sas crenças. Que tal?

A medida precisará passar por mais três votações e uma revisão antes de se tornar lei. Integrantes do partido do ministro das Relações Exteriores de Israel, Avigdor Lieberman, também querem transformar em crime as comemorações do que os palestinos chamam de Nakba (tragédia), que marca a expulsão de cerca de 700 mil refugiados palestinos – incluindo cristãos e muçulmanos – quando foi criado o Estado de Israel, em maio de 1948.

Sammi Michael, presidente da Associação para Direitos Civis de Israel, condenou a atitude em entrevista ao Financial Times. “É uma opressão brutal do direito de livre expressão. Celebrar a Nakba não ameaça a segurança do Estado de Israel. É um direito humano de qualquer pessoa expressar dor diante de um desastre que eles experimentaram”, afirmou.

A informação foi pinçada do blog Diário do Oriente Médio.

3 comentários:

Luiz Felipe Vasques disse...

Milhões de coisas.

Não, eu odiaria, antes de mais nada, que o Brasil avançasse para o retrocesso a tal ponto: uma religião oficial ao custo da liberdade de expressão (o que eu acho que ainda vai acontecer se não no texto formal bonitinho para que se possa precisamente contestar; ao menos em uma prática anônima, não muito diferente do mecanismo do racismo brasileiro).

Mas os brasileiros não são os judeus, no sentido que são origens e significados diferentes.

Não dá pra dizer que ser judeu é uma questão de religião: há judeus declaradamente ateus e declaradamente judeus - e alguém aqui vai chegar para esse judeu ateu e dizer que ele não é judeu? Não funciona assim, portanto, essa redução. A coisa já passa por uma identidade cultural e histórica, com uma linhagem bem estabelecida e reconhecível -- não passa por ai o conceito de Nação, aliás? Se não, um conceito para povo, pelo menos. O povo judeu.

Por muito tempo, uma nação apátrida, que finalmente encontrou um porto baseado em raízes históricas, necessidade pelo menos formalizada desde o século anterior, Der Judenstaadt e tudo o mais.

Entretanto, a raiz religiosa deste país - estabelecido um limite geográfico - é bastante profunda, é difícil não pensar Israel com um mínimo de tons teocráticos (sem conotações negativas nessa última palavra). Mantendo o paralelo, assim como é difícil pensar em um Brasil não-católico, ou não-cristão.

Mas ai, é claro, a porca começa a torcer o rabo. Eu lembro do primeiro ano de ocupação iraquiano, onde um plebiscito feito por lá, sobre qual a forma de governo, agora que o tirano Hussein havia sido deposto, que o povo iraquiano gostaria... apenas para o cartesianismo americano, embasbacado, ouvir que o povo iraquiano queria uma ditadura teocrática -- direito de auto-determinação dos povos: ei, isso é fundamentado pela ONU, inclusive. ;-)

Claro que, aos olhos do que é a formação do estado ocidental, isto é uma aberração. Israel, pelos motivos que lhe cabem, ao pensar em levar a sério essas medidas, aproxima-se mais de seus vizinhos geográficos em termos de mentalidade do que o ocidente que lhe é a principal fonte de apoio.

Se ocidente vai dar os ombrinhos, constrangidinho, e que o pau coma, sem nada fazer de prático a não ser que tão somente lhe aperte o bolso, bem... a mim não será surpresa.

Mas torno a dizer: viva a diversidade. Há os sionistas? É, e há os anti-sionistas. Os que não dão de ombro. E que, graças à Internet, podem se articular, ouvir e serem ouvidos - e igualmente apoiados.

Barone disse...

Olá Felipe,

Você constrói uma argumentação segundo a qual a questão não passa pela religião ao dizer que: “Não dá pra dizer que ser judeu é uma questão de religião”, e que “há judeus declaradamente ateus e declaradamente judeus - e alguém aqui vai chegar para esse judeu ateu e dizer que ele não é judeu? Não funciona assim, portanto, essa redução.”.

E leva o argumento para uma questão de identidade social ao complementar dizendo que: “A coisa já passa por uma identidade cultural e histórica, com uma linhagem bem estabelecida e reconhecível -- não passa por ai o conceito de Nação, aliás? Se não, um conceito para povo, pelo menos. O povo judeu.”.

Ora, Partindo deste ponto, poderíamos, sim, comparar brasileiros e judeus. Poderíamos comparar os brasileiros originais, os nativos indígenas, aos judeus. Afinal, assim como os judeus , que possuem “uma identidade cultural e histórica, com uma linhagem bem estabelecida e reconhecível”, os nossos índios também a possuem. Que tal usarmos isso para justificar a implantação de uma sociedade tribal por aqui e ameaçarmos de prisão àqueles que se recusem a aceitar que Tupã é o manda-chuva? Afinal eles estão aqui há muito mais que dois mil anos.

Você diz também que os judeus formavam “uma nação apátrida, que finalmente encontrou um porto baseado em raízes históricas”. É verdade. O conceito de povo judeu existe há milênios e ter encontrado para este povo uma pátria em que pudessem desenvolver seus valores comuns, longe da perseguição dos que os reprimiam em sua fé, foi uma ação civilizatória. O problema ocorre quando os oprimidos se transformam em opressores, obrigando seus compatriotas a aceitarem que um ente estatal tenha como base a religião, pior, a religião que não professam.

Israel é lar de uma população diversificada, com os mais variados antecedentes étnicos, religiosos, culturais e sociais. De seus mais de 5,5 milhões de habitantes, 81% são judeus (mais da metade nascidos no país, os demais provenientes de cerca de 70 países de todo o mundo), 17,3% são árabes (em sua maioria muçulmanos) e os restantes 1,7% incluem drusos, circassianos e outras pequenas comunidades.

A população não-judaica de Israel conta com mais de um milhão de pessoas, que representam 19% da população (a quem diga que este percentual chega a 24%). Definidos coletivamente como “cidadãos árabes de Israel” eles incluem vários grupos distintos que, embora basicamente sejam todos de fala árabe, possuem diferentes características.

Os árabes muçulmanos, que somam hoje mais de 815 mil pessoas, em sua maioria sunitas, constituem 76% da população não-judaica. Os beduínos formam cerca de 10% da população muçulmana. Os árabes cristãos, cerca de 160 mil, são o segundo grupo minoritário de Israel. A maioria deles pertence às igrejas greco-católica (42%), greco-ortodoxa (32%) e católica-romana (16%). Os drussos, cerca de 95 mil, são uma comunidade distinta do ponto de vista cultural, social e religioso. Os circassianos somam pode volta de 3 mil pessoas. São muçulmanos sunitas, embora não compartilhem a origem árabe e cultural da comunidade islâmica de Israel.

Como impor a estas pessoas - que são cidadãos israelenses e não professam a fé judaica - a aceitação de que o estado em que vivem é um “estado judeu” (no sentido religioso mesmo, e não étnico)? Que democracia é esta que os israelenses costumam citar quando se comparam aos seus vizinhos árabes?

Você finaliza dizendo “viva a diversidade”. Eu assino embaixo.

Luiz Felipe Vasques disse...

Oba!

Ora, Partindo deste ponto, poderíamos, sim, comparar brasileiros e judeus. Poderíamos comparar os brasileiros originais, os nativos indígenas, aos judeus. Afinal, assim como os judeus , que possuem “uma identidade cultural e histórica, com uma linhagem bem estabelecida e reconhecível”, os nossos índios também a possuem. Que tal usarmos isso para justificar a implantação de uma sociedade tribal por aqui e ameaçarmos de prisão àqueles que se recusem a aceitar que Tupã é o manda-chuva? Afinal eles estão aqui há muito mais que dois mil anos.

Fico imaginando se não houve ou há algum antropólogo doidivanas que já tenha pensado isso a sério, algum dia. :)

Mas sim, é verdade. Mas perceba que então não mais falamos de brasileiros como, digamos, eu ou vc, mas de nativos-sul-americanos. A identidade brasileira é muito menos 'identificável' nesse aspecto - o que, em nome da diversidade, eu acho ótimo.

O problema ocorre quando os oprimidos se transformam em opressores, obrigando seus compatriotas a aceitarem que um ente estatal tenha como base a religião, pior, a religião que não professam. Oh, sim, e a porca torce e retorce. Se não deixei aqui escrito, pelo menos repito: será que após tantos mil anos de perseguição, a única lição aprendida é que não há pior feitor que o ex-escravo, não há pior carcereiro que o ex-presidiário?

Que democracia é esta que os israelenses costumam citar quando se comparam aos seus vizinhos árabes?O torcer e o retorcer do rabo, enfim... novamente: é errado, mas parece que ninguém que realmente pode fazer alguma coisa irá se incomodar.