Semana On

quinta-feira, 26 de março de 2009

Soldados israelenses falam de abusos em Gaza

No último dia 20 publiquei aqui o artigo “Jornal israelense denuncia assassinatos de civis palestinos na Faixa de Gaza”, sobre as denúncias do jornalista Amos Harel, do jornal israelesne Haaretz, de que o exército israelense havia assassinado civis na Faixa de Gaza durante a última ofensiva na região. A seguir, traduzo a reportagem 'Shooting and crying', com as transcrições de relatos de soldados que deram origem às denúncias.

'Atirando e chorando'
Por Amos Harel (Tradução Victor Barone)


Menos de um mês depois do encerramento da operação Chumbo Derretido na Faixa de Gaza, dezenas de graduados do programa preparatório da escola pré-militar Yitzhak Rabin, foram convocados para a Academia Oanin, em Kiryat Tivon. Desde 1998 o programa prepara seus participantes para o serviço militar. Muitos assumem postos de comando em combate e outros grupos de elite das Forças de Defesa de Israel (FDI). O fundador do programa, Danny Zamir, ainda o encabeça e serve como sub-comandante de um batalhão da reserva.

Na sexta-feira, 13 de fevereiro, Zamir convidou soldados e oficiais graduados no programa para uma longa discussão sobre as suas experiências em Gaza. Eles falaram abertamente, mas com considerável frustração.

A seguir, há extensas transcrições do encontro, conforme o boletim do programa, Briza, publicado na quarta-feira (17). Os nomes dos soldados foram modificados para preservar sua identidade. Os editores também deixaram de fora alguns detalhes referentes à identidade das unidades que agiram de forma problemática em Gaza.

-

Danny Zamir: "Não é minha intenção que possamos avaliar as realizações e os significados político-diplomáticos da Operação Chumbo Derretido nesta noite, nem de lidar com o seu aspecto militar. Contudo, a discussão é necessária porque esta foi uma ação de guerra excepcional para a história da FDI, que estabeleceu novos limites para o código de ética do exército e do Estado de Israel como um todo.

Esta foi uma ação que semeou destruição maciça entre civis. Não é certo que poderíamos ter agido diferente, mas, em última análise, emergimos desta operação sem que os Qassams fossem interrompidos. É muito possível que repitamos essa operação em grande escala nos próximos anos, porque o problema na Faixa de Gaza não é simples e não é de todo certo que tenha sido resolvido. O que nós queremos nesta noite é ouvir os combatentes."

Aviv: "Eu sou comandante de esquadrão de uma companhia que ainda está sob treinamento na Brigada Givati. Fomos a um bairro na parte sul da cidade de Gaza. De forma geral foi uma experiência especial. No decorrer do treinamento, você aguarda o dia em que entrará em Gaza, e no fim, não é realmente como eles dizem que é. É mais como... você vem, entra em uma casa, expulsa os moradores e ocupa ela. Nós permanecemos em um casa por cerca de uma semana.

Perto do fim da operação, houve um plano para entrar em uma área densamente povoada na cidade de Gaza, propriamente dita. Nas reuniões começaram a falar conosco sobre ordens para abrir fogo no interior da cidade, porque, como você sabe, eles usaram muito poder de fogo e mataram um grande número de pessoas pelo caminho, de modo que não fossemos atingidos e eles não atirassem em nós.

Em um primeiro momento, a ação limitava-se a entrar em uma casa. Nós devíamos entrar nelas com um blindado chamado Achzarit (Cruel) para arrebentar as portas dos níveis inferiores e começar a atirar depois... Eu chamo isso de assassinato... esperava-se que subíssemos de andar em andar e atirássemos nas pessoas que encontrássemos. Inicialmente eu me questionei: qual a lógica disto?

Nossos superiores disseram que isso era permissível pois as pessoas que optaram por ficar no setor e dentro de Gaza estava condenadas, terroristas, pois não tinham fugido. Eu não entendo. Por um lado eles não tinham mesmo para onde fugir, por outro nos dizem que, como eles não fugiram, a culpa era deles. Isso também me assustou um pouco. Eu tentei exercer alguma influência, na medida do possível, a partir da minha posição de subordinado, para alterar esta situação. No final, o procedimento passou a ser o de entrar em uma casa, usar megafones dizendo (aos inquilinos): 'Vamos lá, todos para fora, vocês tem cinco minutos para sair de casa, quem não o fizer será morto.

Eu disse aos nossos soldados 'As ordens mudaram. Nós vamos entrar na casa, eles têm cinco minutos para sair, verificaremos cada pessoa que sai individualmente para confirmar que estão desarmados, e então iniciamos a checagem andar por andar... Isto significa entrar na casa, abrindo fogo em tudo que se move, atirando granadas, todas essas coisas. Então, houve um momento muito chato. Um dos meus soldados veio a mim e perguntou o por que da mudança. Eu disse, 'O que não está claro? Não queremos matar civis inocentes’. Ele respondeu, ‘É? Qualquer um que esteja lá dentro é terrorista, todo mundo sabe disso’. Eu disse, 'Você acha que as pessoas vão realmente fugir? Ninguém vai fugir’. Ele diz, ‘É claro’, e então seus amigos se juntaram a conversa: ‘Temos de matar todos que estejam lá dentro. Sim, qualquer pessoa que esteja em Gaza é terrorista’, e todas as outras coisas que eles meteram na nossa cabeça através da mídia.

Então eu tentei explicar para o cara que nem todo mundo que está lá é terrorista, e que depois que ele mata, digamos, três filhos e quatro mães, vamos subir e matar outras 20 pessoas. E, no fim, se tivermos um prédio de oito andares com cinco apartamentos em cada andar, você terá assassinado de 40 a 50 famílias. Tentei explicar porque nós temos que deixá-los sair e só depois entrarmos em suas casas. Isso não ajudou muito. É frustrante perceber que eles sabem que dentro de Gaza pode-se fazer o que bem entender, arrombar casas por nenhum outro motivo a não ser o prazer de fazer isso.

Você não quer ter a impressão, a partir dos oficiais, de que não existe qualquer lógica para isso, mas eles não dizem nada. Para escrever ‘morte aos árabes’ nas paredes, para cuspir nas fotos de família, apenas porque você pode fazer isso. Penso que esta é a principal questão para compreender o quanto a FDI decaiu no quesito ética. É disso que eu mais vou lembrar.

Um dos nossos oficiais, um comandante de companhia, viu alguém vindo por uma estrada, uma mulher, uma mulher velha. Ela estava caminhando ao longe, mas perto o suficiente, de modo que você poderia mandar alguém até ela. Se ela era suspeita ou não, não sei. No final, ele mandou alguém até o teto para eliminá-la. A partir da descrição desta história, eu senti que se tratava simplesmente de assassinato a sangue frio".

Zamir: "Eu não entendo. Porque ele atirou nela?"

Aviv: "Isso é que é supostamente legal a respeito de Gaza: você vê uma pessoa em uma estrada, caminhando. Ela não tem que estar com uma arma, você não precisa se identificar, você pode, simplesmente, matá-la. Havia uma senhora perto de nós, com quem não vi arma alguma. A ordem era abater esta pessoa assim que a víssemos."

Zvi: "Os relatos de Aviv são precisos, mas é possível entender de onde eles surgem. E essa mulher, você não sabe se ela era... Não era para ela estar lá, porque houve comunicados e bombardeios. A lógica diz que ela não deveria estar lá. O jeito de descrever isso, como assassinato a sangue frio, não é correto. Sabe-se que eles têm informantes e este tipo de coisa."

Gilad: "Mesmo antes de sairmos, o comandante do batalhão deixou claro para todos uma lição muito importante, tirada da Segunda Guerra do Líbano. Foi a forma como a FDI adentra uma região - com muito poder de fogo. A intenção é a de proteger os soldados por meio deste poder de fogo. Na operação, as nossas perdas foram realmente leves e o preço disso foi um monte de palestinos mortos."

Ram: "Eu servi em uma companhia de operações na Brigada Givati. Depois de termos ido para as primeiras casas, encontramos uma casa com uma família dentro. Parecia relativamente calma. Nós não abrimos fogo, gritamos para que todos descessem. Nós os colocamos em uma sala e, depois, saímos da casa e entramos em outra. Alguns dias depois recebemos ordens de libertar a família. Eles tinham atiradores posicionados no teto. O comandante do pelotão deixou a família sair e disse para irem para a direita. Uma mãe e seus dois filhos não entenderam e foram para a esquerda, mas esqueceram de dizer ao atirador no telhado que os deixassem passar... ele fez o que se esperava dele, seguiu suas ordens."

Pergunta do público: “A que distância se deu isso?”

Ram: "Entre 100 e 200 metros, algo assim. Eles saíram da casa onde o atirador estava, avançaram um pouco e, de repente, ele viu pessoas que se deslocavam em uma área onde estavam proibidos de estar. Eu não acho que ele sentiu-se muito mal com isso, porque, afinal de contas, até onde ele sabia, estava fazendo seu trabalho de acordo com as ordens que recebeu. E a atmosfera em geral, pelo que entendi a partir da conversa que tive com meus homens... não sei como descrever... A vida dos palestinos, vamos dizer assim, é algo muito, muito menos importante do que as vidas dos nossos soldados. Então, é assim que se justificam estas coisas."

Yuval Friedman (instrutor chefe do programa Rabin): "Não havia uma ordem para solicitar permissão para abrir fogo?"

Ram: "Não. Não existe isso além de uma determinada linha. A idéia é que se você está com medo, eles vão escapar de você. Se um terrorista se aproxima e ele está muito perto, ele podia rebentar com a casa ou algo assim ".

Zamir: "Após mortes como estas, por engano, houve alguma investigação na FDI? Eles analisaram como isso poderia ter sido evitado?"

Ram: "Não veio ninguém da unidade de investigação da Polícia Militar. Não houve nenhum... Para todos os incidentes, existem investigações individuais e exames gerais, durante todo o desenrolar da guerra. Mas eles não focam nisso especificamente."

Moisés: "A atitude é muito simples: Não é agradável de dizer isso, mas ninguém se preocupa. Nós não estamos investigando esta questão. Isto é o que acontece durante o combate e durante a rotina da segurança."

Ram: "O que eu lembro, em especial no começo, é a sensação de uma quase missão religiosa. Meu sargento é um estudante de um hesder yeshiva (um programa que combina estudo e serviço militar religiosa). Antes de irmos, ele reuniu o pelotão inteiro e fez uma oração para os que iam para a batalha. Um rabino da brigada estava lá, entrou em Gaza e correu conosco encorajando-nos e rezando. E, também, quando estávamos lá dentro, nos enviaram livretos cheios de Salmos, uma tonelada de Salmos. Penso que, pelo menos na casa onde fiquei por uma semana, poderíamos encher uma sala com salmos, folhetos e coisas assim.

Houve uma enorme lacuna entre o material da academia e o que os rabinos da FDI mandaram. A academia publicou um panfleto para comandantes - algo sobre o histórico do combate de Israel em Gaza desde 1948 até o presente. Os rabinos trouxeram uma lote de livros e artigos, e sua mensagem era muito clara: Nós somos o povo judeu, que veio a esta terra por um milagre, Deus nos trouxe de volta a esta terra e agora temos de lutar para expulsar os infiéis que estão interferindo com a nossa conquista dessa terra santa. Esta foi a mensagem principal, e toda a noção que muitos soldados tiveram nesta operação foi de que ela era uma guerra religiosa. Da minha posição como um comandante, eu tentava falar sobre a política - os fluxos na sociedade palestina, sobre como não é todo mundo que está com o Hamas em Gaza, e que não é cada habitante que quer nos derrotar. Eu queria explicar aos soldados que esta guerra não é uma guerra para a santificação do santo nome, mas sim para por fim aos Qassams."

Zamir: "Gostaria de pedir aos pilotos que estão aqui, Gideon e Yonatan, que nos contem um pouco sobre as suas perspectivas. Como soldado de infantaria, isso me interessara. Como se sentem quando bombardeiam uma cidade como essa?"

Gideon: "Em primeiro lugar, sobre o que você disse a respeito da insana quantidade de poder de gogo: Na primeira incursão durante os combates, o poder de fogo foi impressionante, muito grande, e foi isso que fez com que todos os Hamasniks se escondessem nos abrigos mais profundos e fez com que eles se escondessem até duas semanas após os combates.

Em geral, a forma como funciona para nós, para você entender um pouco as diferenças, é que à noite eu voltava para o esquadrão, faria uma incursão na Faixa de Gaza e iria para casa dormir. Eu iria para casa dormir, em Tel Aviv, na minha cama quente. Não estou preso em uma cama na casa de uma família palestina, o que faz a vida é um pouco melhor.

Quando estou com o esquadrão, não vejo um terrorista lançando um Qassam e depois decido voar atrás dele. Existe todo um sistema que nos dá suporte, que serve como nossos olhos, ouvidos e inteligência, criando mais e mais alvos em tempo real, de um nível de legitimidade ou de outra. Em qualquer caso, eu tento acreditar que estes são objetivos (determinados de acordo com) o mais alto nível possível de legitimidade.

Eles lançaram panfletos sobre Gaza e, às vezes, disparavam um míssil de um helicóptero na esquina de alguma casa, só para agitar um pouco, para que todos dentro da casa fugissem. Essas coisas funcionavam. As famílias saem, e as pessoas de verdade (ou seja, os soldados) podem entrar em casas vazias, pelo menos de civis inocentes. Sob esta perspectiva é que funciona.

De qualquer forma, eu chego ao esquadrão, obtenho um alvo com uma descrição e coordenadas, e, basicamente, certifico-me de que não está dentro da linha das nossas forças. Eu olho para a imagem da casa que tenho que atacar, vejo se ela corresponde a realidade, avanço, aperto o botão e a bomba atinge o alvo.

Zamir: "Entre os pilotos, há também os que falam em remorso? Por exemplo, eu fiquei terrivelmente surpreso com o entusiasmo em torno da morte de guardas de trânsito em Gaza no primeiro dia da operação. Mataram 180 guardas. Como piloto, eu teria questionado isso."

Gideon: "Existem duas questões aí. Taticamente falando, você chamá-los de 'policiais'... Em qualquer caso, eles estão armados e pertencem ao Hamas... Nos bons tempos estas pessoas pegaram o pessoal do Fatah e os jogaram pela janela para ver o que aconteceria.

No que diz respeito ao pensamento, você se senta com o esquadrão e existem muitas discussões sobre o significado da guerra, sobre o que estamos fazendo, há muita coisa para falar. A partir do momento em que você liga o motor do avião até o momento em que você o desliga, todos os seus pensamentos, toda a sua concentração e toda a sua atenção estão na missão que você tem de levar à cabo. Se você tem uma dúvida injustificada, você fica susceptível a estragar tudo e acertar uma escola com 40 crianças. Se o prédio não é o alvo que eu deveria atingir, mas sim uma casa onde estão os nossos soldados, o preço do erro é muito, muito elevado."

Pergunta da platéia: “Alguém no esquadrão não apertou o botão, pensou duas vezes?”

Gideon: "Essa pergunta deve ser dirigida às pessoas envolvidas nas operações com helicópteros. Com as armas que eu usei, a minha capacidade de tomar uma decisão que contradiz o que me foi dito é igual a zero. Eu lanço uma bomba de uma altura na qual posso ver toda a Faixa de Gaza. Vejo também Haifa, vejo o Sinai, mas é mais ou menos o mesmo. É realmente longe."

Yossi: "Eu sou sargento de um pelotão de operações em uma companhia de pára-quedistas da Brigada. Nós estávamos em uma casa e descobrimos uma família em seu interior, que não deveria estar ali. Nós os colocamos no porão, e deixamos dois guardas para assegurar que não causassem problemas. Gradualmente, o distanciamento emocional entre nós se rompeu – nós fumamos cigarros com eles, bebemos café com eles, falamos sobre o significado da vida e os combates em Gaza. Depois de muitas conversas o proprietário da casa, um homem de mais de 70 anos, disse que era bom que nós estivéssemos em Gaza, que era bom que a FDI estivesse fazendo o que estava fazendo.

No dia seguinte enviamos o dono da casa e seu filho, um homem de 40 ou 50, para interrogatório e descobrimos que ambos eram ativistas políticos no Hamas. Isso foi um pouco chato – que eles nos dissessem que era legal estarmos ali e blá-blá-blá, e então você descobre que eles estavam mentindo na sua cara o tempo todo.

O que me aborreceu foi que, no final, depois de descobrir que os membros desta família não eram exatamente nossos bons amigos e saber que eles mereciam ser forçados a sair, o meu comandante de pelotão sugeriu que, quando saíssemos da casa, deveríamos limpar todas as coisas, pegar e recolher todo o lixo em sacos, varrer e lavar o chão, dobrar os cobertores, fazer uma pilha com os colchões e colocá-los de volta nas camas."

Zamir: "O que você quer dizer? Todas as unidades da FDI que deixam uma casa não fazem isso?"

Yossi: "Não, absolutamente. Pelo contrário: na maioria das casas deixamos pichações para trás e coisas deste tipo.”

Zamir: "Isso é simplesmente compotar-se como animais."

Yossi: "Não se espera que você dobre cobertores enquanto estão atirando em você."

Zamir: "Eu não ouvi que estavam atirando em vocês. Não é disso que eu estou reclamando, mas se você já passou uma semana em uma casa, limpe sua sujeira."

Aviv: "Recebemos uma ordem num dia: todo o equipamento, todos os móveis, limpar toda a casa. Nós jogamos tudo, tudo pelas janelas para fazer espaço. Todo o conteúdo das casas voa pelas janelas."

Yossi: "Houve um dia, quando um Katyusha, um Grad, caiu em Be'er Sheva e uma mãe e seu bebê foram feridos. Eram vizinhos de um dos meus soldados. Ouvimos toda a história no rádio, e ele não gostou nada. Então, o cara era um pouco vingativo e você pode entendê-lo. Como dizer a uma pessoa como essa que ‘vá lá, vamos lavar o chão da casa de um ativista político no Hamas, que acabou de lançar um Katyusha contra seus vizinhos, fazendo com que um deles tivesse a uma perna amputada?’ Não é uma coisa fácil de fazer, especialmente se você não concordar com ele em tudo. Quando o meu comandante de pelotão disse ‘ok, diga a todos que empilhem colchões e cobertores, não foi fácil para mim fazê-lo’. Houve muita gritaria. No fim das contas, eu estava convencido e percebi que realmente era a coisa certa a fazer. Hoje, eu aprecio e até mesmo admiro ele, o comandante do pelotão, pelo o que aconteceu lá. No fim das contas não me parece que nenhum exército, o exército sírio, o exército afegão, iria lavar o chão da casa do inimigo, e ele certamente não dobraria cobertores para colocá-los de volta nos armários."

Zamir: "Penso que seria importante que os pais se sentassem aqui e ouvissem este debate. Penso que seria um instrutivo debate, e também muito desanimador e deprimente. Você está descrevendo um exército com normas éticas muito baixas, esta é a verdade... Eu não estou julgando você e não estou reclamando para você. Estou apenas refletindo sobre o que estou sentindo depois de ouvir suas histórias. Eu não estava em Gaza, e assumo que entre os soldados da reserva o nível de restrição e controle é superior, mas acho que no seu conjunto, vocês estão refletindo e descrevendo o tipo de situação no qual estávamos envolvidos.

Após a Guerra dos Seis Dias, quando as pessoas voltavam do combate, elas sentavam em rodas e descreviam o que haviam sofrido. Durante muitos anos as pessoas que fizeram isso diziam ter ‘atirado chorando’. Em 1983, quando voltamos da guerra no Líbano, as mesmas coisas foram ditas sobre nós. Temos de pensar sobre os eventos que temos vivenciado. Temos de lidar com eles também, em termos da criação de uma norma ou de normas diferentes.

É muito possível que o Hamas e o exército sírio se comportem de maneira diferente de nós. O ponto é que não somos o Hamas e não somos o exército sírio ou o exército egípcio, e se clérigos estão nos incomodando com unção e colocando livros sagrados em nossas mãos, e se os soldados nessas unidades não são representantes de todo o espectro do povo judeu, mas sim de certos segmentos da população - o que estamos esperando? Para quem vamos nos queixar?

Como reservistas nós não levamos tão a sério as ordens das brigadas regionais. Nós deixamos que velhos e famílias passem. Porque matar pessoas quando está claro para você que são civis? Qual o aspecto da segurança de Israel que será prejudicado, quem será prejudicado? Exercitem o julgamento, sejam humanos."

3 comentários:

Adriana Godoy disse...

Estou perdendo a hora do almoço para ficar lendo esse relato surpreendente sobre a visão dos soldados. O que mais impressiona é a naturalidade de se falar em assassinato (como o da velha), em invadir as casas, em acreditar que estão fazendo a coisa certa. A história do homem e seu filho que eram do Hamas e mentiram aos soldados também é muito interessante.
Isso não virou um documentário?

Barone, admiro sua insistência em não deixar passar em branco um assunto como esse. Beijo.

Vanessa Anacleto disse...

Venho acompanhando este blog há alguns dias , não lembro se deixei comentário aqui e quero parabenizar suas publicações tão diferentes do que sai normalmente na mídia aqui no Brasil sobre o assunto.

Abraço

Barone disse...

Adriana: esta naturalidade é o reflexo da banalização da violência. É horrível não é? Mas não penso que seja uma particularidade do conflito árabe-isaelense. Acho, na verdade, que esta insensibilidade esta entranhada em todas as sociedades na atualidade e é devido a ela que permitimos que horrores como estes, relatados pelos soldados, sejam possíveis.

Olá Vanessa. Que bom que está gostando. Volte mais vezes.