O jornalista Luiz Carlos Azenha fez um desabafo em seu blog na terça-feira retrasada. No post “Quando o ‘opinionismo’ derrota a reportagem, o Jornalismo sofre”, desfia quatro “fenômenos” que, em sua opinião, transformaram o Jornalismo feito no Brasil: a implantação do "centralismo democrático", no estilo leninista, nas redações; a vitória do "opinionismo"; a oposição sistemática da mídia corporativa ao governo federal e o surgimento da internet.
O primeiro fenômeno que, segundo Azenha, fez com que as reportagens se transformassem em "teses dos editores”, seria o direcionamento da pauta pela chefia. “O que será dito é pré-determinado”, afirma o jornalista. “Na Globo, por exemplo, se o assunto são as cotas raciais, não há qualquer chance de um repórter emplacar uma reportagem que não reproduza exatamente o que pensa o Ali Kamel”, sustenta e, em seguida, explica em detalhes: “O texto é enviado para o diretor ler, ele mexe no que achar necessário e ponto final. Mais tarde a reportagem será vista antes de entrar no ar. Se não passar pelo crivo, é modificada ou ‘cai’ (vai para a gaveta)”.
Outra questão levantada por Azenha é a partidarização da mídia corporativa que “faz oposição ao governo federal desde que Lula assumiu em 2002”. O jornalista desfia sua experiência na TV Globo, onde, segundo seu testemunho, não há equilíbrio na cobertura política: “Enquanto investiguei o caixa dois do PT em Goiás -- aliás, com sucesso --, tudo bem. Mas quando era para investigar a turma do Serra, gaveta!”.
O jornalista Rodrigo Vianna também abordou o tema recentemente, citando sua experiência na TV Globo: “Intervenção minuciosa em nossos textos, trocas de palavras a mando de chefes, entrevistas de candidatos (gravadas na rua) escolhidas a dedo, à distância, por um personagem quase mítico que paira sobre a Redação: ‘o fulano (e vocês sabem de quem estou falando) quer esse trecho; o fulano quer que mude essa palavra no texto’.”.
Leitor de Azenha, o médico pediatra Marcelo Silber toca na ferida ao comentar o desabafo do jornalista. “De fato, a mídia tupiniquim deixou de ser investigativa, passou a ser somente opinativa (e de péssima qualidade) e pior, se partidarizou. Porém há também mídia favorável ao governo federal, e nesta mídia (seja via escrita, falada, radio, tv ou internet) tudo referente ao PSDB não presta.”.
Ora, esta é a realidade da mídia corporativa ou do Jornalismo de forma geral? Penso que o último suspeito carrega mais evidências do crime. Digam-me em que veículo de comunicação, seja no mainstream ou no dito campo alternativo, há liberdade, de fato, para o fazer jornalístico? O crivo da chefia está sempre presente ou, ao menos, a orientação editorial que passa por interesses políticos e econômicos e determina o que pode ou não ser dito. Ou não?
Particularmente, nunca atuei – como diz ter tido a sorte Sergio Leo - em uma redação na qual (em especial nas editorias de política ou que se dedicam a cobrir a ação do poder público) o jornalista tivesse plena liberdade de apurar, escrever e publicar de acordo com critérios puramente técnicos ou deontológicos. Também não acho – como apontou o Pedro Doria (aqui e aqui) que o Jornalismo brasileiro passe por um momento de mais profissionalismo e objetividade. Em minhas parcas experiências profissionais houve sempre o senão, o porém, o crivo que dirigia a informação de acordo com o interesse do veículo.
Portanto, a questão que me intriga é saber se há, de fato, este Jornalismo balanceado, objetivo, isento.
Em um recente artigo intitulado “Jornalismo e assessoria de imprensa: ética e realidade”, onde analisei as diferenças entre as duas atividades, citei os jornalistas Ricardo Setti e Bernardo Ajzemberg, para quem há, sim, um jornalismo imparcial, puro. Há? Jornalista e Doutor em Comunicação pela UFRJ, Boanerges Lopes também questiona: “... será que existe autonomia necessária para se praticar jornalismo em algum canto do mundo? Difícil responder”.
O jornalista e sociólogo Jayme Brenner, na mesma linha, sustenta que não há possibilidade de manter imparcialidade ou independência (e, por conseguinte, manter-se ético) no Jornalismo. Ele cita exemplos de sua experiência nos jornais Folha de S.Paulo e Correio Braziliense, quando teve que amaciar reportagens que iam contra os interesses dos veículos e desafia: “... atire o primeiro ‘lead’ quem não deu uma forcinha para uma fonte, um político, um amigo ou uma empresa em suas matérias. A rigor, atire a primeira pedra quem jamais discutiu uma matéria com uma fonte de confiança...”.
Pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (Nemp) da Universidade de Brasília, o professor Venício A. de Lima dá uma espanada na teoria fincando pé firme na realidade das redações: “Qualquer estudante de jornalismo sabe (ou deveria saber), que imparcialidade e objetividade são princípios irrealizáveis na prática concreta da apuração e da redação de notícias, sejam elas de política ou de outra editoria. O que se busca no jornalismo sério e responsável é minimizar a contaminação da cobertura pelas preferências pessoais do(a) repórter e pelos interesses dos donos dos jornais, expressos nos editoriais e nas colunas de opinião dos respectivos veículos”.
De que Jornalismo estamos falando então? Muito se tem debatido sobre a crise no Jornalismo. Muito mais que financeira, está crise é deontológica. Estamos dizendo o que o leitor quer saber? Devemos tentar dizer o que achamos que o leitor deve saber? Temos que nos ater ao fato, inodoro e insípido? Devemos adotar uma postura didática ou política?
Caminhamos por um corredor escuro repleto de portas trancadas. Há muitas saídas para reencontrarmos ou reinventarmos nossa profissão, alguém sabe a saída correta?
O primeiro fenômeno que, segundo Azenha, fez com que as reportagens se transformassem em "teses dos editores”, seria o direcionamento da pauta pela chefia. “O que será dito é pré-determinado”, afirma o jornalista. “Na Globo, por exemplo, se o assunto são as cotas raciais, não há qualquer chance de um repórter emplacar uma reportagem que não reproduza exatamente o que pensa o Ali Kamel”, sustenta e, em seguida, explica em detalhes: “O texto é enviado para o diretor ler, ele mexe no que achar necessário e ponto final. Mais tarde a reportagem será vista antes de entrar no ar. Se não passar pelo crivo, é modificada ou ‘cai’ (vai para a gaveta)”.
Outra questão levantada por Azenha é a partidarização da mídia corporativa que “faz oposição ao governo federal desde que Lula assumiu em 2002”. O jornalista desfia sua experiência na TV Globo, onde, segundo seu testemunho, não há equilíbrio na cobertura política: “Enquanto investiguei o caixa dois do PT em Goiás -- aliás, com sucesso --, tudo bem. Mas quando era para investigar a turma do Serra, gaveta!”.
O jornalista Rodrigo Vianna também abordou o tema recentemente, citando sua experiência na TV Globo: “Intervenção minuciosa em nossos textos, trocas de palavras a mando de chefes, entrevistas de candidatos (gravadas na rua) escolhidas a dedo, à distância, por um personagem quase mítico que paira sobre a Redação: ‘o fulano (e vocês sabem de quem estou falando) quer esse trecho; o fulano quer que mude essa palavra no texto’.”.
Leitor de Azenha, o médico pediatra Marcelo Silber toca na ferida ao comentar o desabafo do jornalista. “De fato, a mídia tupiniquim deixou de ser investigativa, passou a ser somente opinativa (e de péssima qualidade) e pior, se partidarizou. Porém há também mídia favorável ao governo federal, e nesta mídia (seja via escrita, falada, radio, tv ou internet) tudo referente ao PSDB não presta.”.
Ora, esta é a realidade da mídia corporativa ou do Jornalismo de forma geral? Penso que o último suspeito carrega mais evidências do crime. Digam-me em que veículo de comunicação, seja no mainstream ou no dito campo alternativo, há liberdade, de fato, para o fazer jornalístico? O crivo da chefia está sempre presente ou, ao menos, a orientação editorial que passa por interesses políticos e econômicos e determina o que pode ou não ser dito. Ou não?
Particularmente, nunca atuei – como diz ter tido a sorte Sergio Leo - em uma redação na qual (em especial nas editorias de política ou que se dedicam a cobrir a ação do poder público) o jornalista tivesse plena liberdade de apurar, escrever e publicar de acordo com critérios puramente técnicos ou deontológicos. Também não acho – como apontou o Pedro Doria (aqui e aqui) que o Jornalismo brasileiro passe por um momento de mais profissionalismo e objetividade. Em minhas parcas experiências profissionais houve sempre o senão, o porém, o crivo que dirigia a informação de acordo com o interesse do veículo.
Portanto, a questão que me intriga é saber se há, de fato, este Jornalismo balanceado, objetivo, isento.
Em um recente artigo intitulado “Jornalismo e assessoria de imprensa: ética e realidade”, onde analisei as diferenças entre as duas atividades, citei os jornalistas Ricardo Setti e Bernardo Ajzemberg, para quem há, sim, um jornalismo imparcial, puro. Há? Jornalista e Doutor em Comunicação pela UFRJ, Boanerges Lopes também questiona: “... será que existe autonomia necessária para se praticar jornalismo em algum canto do mundo? Difícil responder”.
O jornalista e sociólogo Jayme Brenner, na mesma linha, sustenta que não há possibilidade de manter imparcialidade ou independência (e, por conseguinte, manter-se ético) no Jornalismo. Ele cita exemplos de sua experiência nos jornais Folha de S.Paulo e Correio Braziliense, quando teve que amaciar reportagens que iam contra os interesses dos veículos e desafia: “... atire o primeiro ‘lead’ quem não deu uma forcinha para uma fonte, um político, um amigo ou uma empresa em suas matérias. A rigor, atire a primeira pedra quem jamais discutiu uma matéria com uma fonte de confiança...”.
Pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (Nemp) da Universidade de Brasília, o professor Venício A. de Lima dá uma espanada na teoria fincando pé firme na realidade das redações: “Qualquer estudante de jornalismo sabe (ou deveria saber), que imparcialidade e objetividade são princípios irrealizáveis na prática concreta da apuração e da redação de notícias, sejam elas de política ou de outra editoria. O que se busca no jornalismo sério e responsável é minimizar a contaminação da cobertura pelas preferências pessoais do(a) repórter e pelos interesses dos donos dos jornais, expressos nos editoriais e nas colunas de opinião dos respectivos veículos”.
De que Jornalismo estamos falando então? Muito se tem debatido sobre a crise no Jornalismo. Muito mais que financeira, está crise é deontológica. Estamos dizendo o que o leitor quer saber? Devemos tentar dizer o que achamos que o leitor deve saber? Temos que nos ater ao fato, inodoro e insípido? Devemos adotar uma postura didática ou política?
Caminhamos por um corredor escuro repleto de portas trancadas. Há muitas saídas para reencontrarmos ou reinventarmos nossa profissão, alguém sabe a saída correta?
1 comentário:
Quem dera todo jornalista tivesse essa preocupação. Certamente, teríamos uma mídia mais crível, mais honesta. Torço para que mais e mais jornalistas façam de sua coluna um hábito.
PS: Indiquei seu blogue a um irmão meu que é jornalista. Ele disse que já o conhecia, pois foi ao MS para um lançamento da exposição de Guimarães Rosa. E por sinal, gostou muito de seu blogue. Bj
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