No último domingo, 22, postei aqui uma frase de Pedro Doria, pinçada de uma reflexão feita pelo jornalista em seu blog, a respeito das origens autoritárias das constituições de Venezuela, Bolívia e Equador. Dizia Doria: “Há um conceito novo de revolução de esquerda sendo testado na América Latina, uma revolução constitucional idealizada por um ex-fascista tornado comunista.”.
O post recebeu o seguinte comentário do jornalista e blogeiro Pedro Ayres: “É bem engraçado esse tipo de pensamento, além de ser ter como base a opinião de alguém simpático ao direitismo e estar à leguas do que seja a verdade dos fatos e da história política daquele país.”.
Ayres discorda da análise feita por Doria que, por sua vez, inspirou-se em um artigo do jornalista Joshua Partlow, publicado no dia 17 de fevereiro no The Washington Post, e em reportagem do jornal espanhol ABC, de novembro de 2007, segundo a qual a constituição dos três países foi escrita (ou profundamente influenciada) por um grupo de acadêmicos espanhóis – reunidos no Centro de Estudos Político e Sociais (CEPS), da Universidade de Valença - encabeçado por Roberto Viciano Pastor.
Professor de Direito Constitucional na Universidade de Valencia (titular da Cátedra Jean Monnet sobre Instituições Comunitárias), Pastor é ex-militante do grupo fascista Fuerza Nova, que na década de 60 apoiava o ditador Francisco Franco na Espanha.
Não é a primeira vez que o presidente da Venezuela, Hugo Chavez, se envolve com ideólogos de origem fascista. Basta uma rápida pesquisa no google para relacionar seu nome ao do sociólogo e cientista político argentino Norberto Ceresole.
Ora, perguntará o leitor menos avisado, mas que diabos têm a ver as mudanças políticas na América Latina com fascismo? A pergunta seria bem colocada, visto que todos estes movimentos sociais procuram se alinhar com a esquerda. Não é “socialista” a revolução proposta por Chavez e seus companheiros de Equador e Bolívia?
Benito Mussolini resumiu a doutrina fascista numa regra concisa: "Tudo para o Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado.". Se alguém lembrar dos totalitarismos de esquerda ao ouvir este conceito não poderá ser condenado por isso. De fato, o empoderamento do Estado é comum a várias linhas políticas - de esquerda e direita - que se relacionam pelo seu viés totalitário. Mussolini, Hitler, Franco, Stalin, Perón, Vargas, etc, etc, etc. Todos se alimentaram da leitura fascista na qual o poder se concentra nas mãos do Estado.
“Em comum, as três Cartas (Venezuela, Bolívia e Equador) tratam da re-fundação de seus países para corrigir injustiças históricas em torno de um ideal mítico, seja a memória de Simón Bolívar, seja a cultura das populações indígenas locais. Na prática, as Cartas sob orientação do CEPS promovem a concentração de poder nas mãos do Executivo.”, afirma Pedro Doria. Nada mais do que a verdade.
Não ocorre o mesmo na ilha de Fidel, na China de Hu Jintao, na Coréia do Norte de Kim Jong-il?
No artigo “Sombras no avanço da esquerda”, publicado no jornal O Estado de S.Paulo no último dia 22, o sociólogo José de Souza Martins vai à fundo na questão. Segundo ele, as políticas implementadas por esta nova mobilização na América Latina “são demandas de esquerda porque questionam as estruturas sociais injustas, as iniqüidades que se renovam, a economia que não gesta transformações nem viabiliza uma sociedade nova, de desigualdades sociais no mínimo atenuadas”. No entanto, continua Martins, suas respostas são “oriundas desse neo-autoritarismo, que se materializa nos governos da nova esquerda latino-americana”, e “tem sido, na verdade, respostas de direita”.
Não faço, aqui, uma defesa da democracia representativa. Tenho cá minhas dúvidas sobre sua funcionalidade. No entanto, substituí-la por um simulacro de democracia direta de cunho autoritário, como têm feito Chavez, é solução pior.
Penso que continuamos nos digladiando sobre a mesma dicotomia que coloca liberdade e igualdade em campos opostos. Os conceitos de esquerda e de direita, longe de se configurarem em temas desgastados, estão inseridos em todos os debates que travamos. O grande perigo, que se fortaleceu com a destruição dos totalitarismos de esquerda no século passado, é a noção de que esquerda é apenas, única e exclusivamente o fortalecimento do Estado. É este pensamento que permite chamarmos de revolução socialista um regime fascista e condenarmos ao lixo histórico conceitos sócio-políticos que, ao contrário, deveriam estar sendo debatidos diante da crise estrutural que as sociedades contemporâneas vivenciam.
Leia mais sobre este tema:
- Conduzindo a boiada
- Sabedoria popular?
- Economia faria maioria dos brasileiros trocar democracia por ditadura
O post recebeu o seguinte comentário do jornalista e blogeiro Pedro Ayres: “É bem engraçado esse tipo de pensamento, além de ser ter como base a opinião de alguém simpático ao direitismo e estar à leguas do que seja a verdade dos fatos e da história política daquele país.”.
Ayres discorda da análise feita por Doria que, por sua vez, inspirou-se em um artigo do jornalista Joshua Partlow, publicado no dia 17 de fevereiro no The Washington Post, e em reportagem do jornal espanhol ABC, de novembro de 2007, segundo a qual a constituição dos três países foi escrita (ou profundamente influenciada) por um grupo de acadêmicos espanhóis – reunidos no Centro de Estudos Político e Sociais (CEPS), da Universidade de Valença - encabeçado por Roberto Viciano Pastor.
Professor de Direito Constitucional na Universidade de Valencia (titular da Cátedra Jean Monnet sobre Instituições Comunitárias), Pastor é ex-militante do grupo fascista Fuerza Nova, que na década de 60 apoiava o ditador Francisco Franco na Espanha.
Não é a primeira vez que o presidente da Venezuela, Hugo Chavez, se envolve com ideólogos de origem fascista. Basta uma rápida pesquisa no google para relacionar seu nome ao do sociólogo e cientista político argentino Norberto Ceresole.
Ora, perguntará o leitor menos avisado, mas que diabos têm a ver as mudanças políticas na América Latina com fascismo? A pergunta seria bem colocada, visto que todos estes movimentos sociais procuram se alinhar com a esquerda. Não é “socialista” a revolução proposta por Chavez e seus companheiros de Equador e Bolívia?
Benito Mussolini resumiu a doutrina fascista numa regra concisa: "Tudo para o Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado.". Se alguém lembrar dos totalitarismos de esquerda ao ouvir este conceito não poderá ser condenado por isso. De fato, o empoderamento do Estado é comum a várias linhas políticas - de esquerda e direita - que se relacionam pelo seu viés totalitário. Mussolini, Hitler, Franco, Stalin, Perón, Vargas, etc, etc, etc. Todos se alimentaram da leitura fascista na qual o poder se concentra nas mãos do Estado.
“Em comum, as três Cartas (Venezuela, Bolívia e Equador) tratam da re-fundação de seus países para corrigir injustiças históricas em torno de um ideal mítico, seja a memória de Simón Bolívar, seja a cultura das populações indígenas locais. Na prática, as Cartas sob orientação do CEPS promovem a concentração de poder nas mãos do Executivo.”, afirma Pedro Doria. Nada mais do que a verdade.
Não ocorre o mesmo na ilha de Fidel, na China de Hu Jintao, na Coréia do Norte de Kim Jong-il?
No artigo “Sombras no avanço da esquerda”, publicado no jornal O Estado de S.Paulo no último dia 22, o sociólogo José de Souza Martins vai à fundo na questão. Segundo ele, as políticas implementadas por esta nova mobilização na América Latina “são demandas de esquerda porque questionam as estruturas sociais injustas, as iniqüidades que se renovam, a economia que não gesta transformações nem viabiliza uma sociedade nova, de desigualdades sociais no mínimo atenuadas”. No entanto, continua Martins, suas respostas são “oriundas desse neo-autoritarismo, que se materializa nos governos da nova esquerda latino-americana”, e “tem sido, na verdade, respostas de direita”.
Não faço, aqui, uma defesa da democracia representativa. Tenho cá minhas dúvidas sobre sua funcionalidade. No entanto, substituí-la por um simulacro de democracia direta de cunho autoritário, como têm feito Chavez, é solução pior.
Penso que continuamos nos digladiando sobre a mesma dicotomia que coloca liberdade e igualdade em campos opostos. Os conceitos de esquerda e de direita, longe de se configurarem em temas desgastados, estão inseridos em todos os debates que travamos. O grande perigo, que se fortaleceu com a destruição dos totalitarismos de esquerda no século passado, é a noção de que esquerda é apenas, única e exclusivamente o fortalecimento do Estado. É este pensamento que permite chamarmos de revolução socialista um regime fascista e condenarmos ao lixo histórico conceitos sócio-políticos que, ao contrário, deveriam estar sendo debatidos diante da crise estrutural que as sociedades contemporâneas vivenciam.
Leia mais sobre este tema:
- Conduzindo a boiada
- Sabedoria popular?
- Economia faria maioria dos brasileiros trocar democracia por ditadura
4 comentários:
Barone, parabéns pelo artigo! É muito importante colocar os dois lados e vocês têm feito isto em vários assuntos, e não só neste!
Caro Barone
Segundo confiáveis fontes universitárias e políticas espanholas o professor Roberto Viciano Pastor é membro do PCE desde a Juventude. Para melhor entender o que se passou segue um endereço com algumas informações:
Un juez obliga a rectificar al diario español ABC por mentir el año pasado ou http://www.aporrea.org/medios/n111135.html
Grato
Olá Ayres,
estou pesquisando esta informação.
Barone,
Excelente texto. Muito boa essa lucidez com a qual você observa o tema. Parabéns!
Enviar um comentário