Jucá: “Centro-oeste não saiu no prejuízo”
Relator da reforma tributária fala do futuro do país
Victor Barone
O senador Romero Jucá (PMDB-RO) esteve sob os holofotes nos últimos meses. Relator da reforma tributária homologada na semana passada pelo Congresso Nacional, teve que navegar por um mar agitado, repleto de icebergs pontiagudos pilotados por prefeitos, governadores e representantes da União, todos ávidos por abocanhar um pedaço mais gordo do bolo tributário brasileiro. No final das contas, a bonança veio e trouxe, segundo Jucá, expectativas de um modelo mais justo. Em entrevista concedida ontem com exclusividade a O Estado, falando de Recife, onde descansava com a família, o senador peemedebista fez questão de ressaltar o Centro Oeste e o Mato Grosso do Sul, garantindo que os receios de que a reforma trouxesse nos prejuízos econômicos são infundadas.No final das contas, a reforma tributária valeu a pena?
Valeu muito a pena. Avançamos muito, não só nas questões pontuais, mas também no modelo tributário. A proposta da Câmara Federal se limitava a unificação do ICMS. Conseguimos agregar a isso o passo seguinte, a partilha da receita da União com estados e municípios. Pontualmente, implementamos ações importantes que afetam o modelo tributário, como a desoneração dos bens de capital e da folha de pagamento. No caso do ICMS, optamos pela alíquota mínima para insumos, equipamentos e implementos agrícolas, que são importantes para o Mato Grosso do Sul e para a região Centro Oeste. Criamos o fundo de compensação pelas exportações, para que os exportadores de matéria prima tenham um pouco mais de ganho, o que também é o caso do Centro Oeste. Melhoramos a situação dos municípios, criando um fundo de desenvolvimento regional para investimento público, que contará com R$ 2,2 bilhões. Acho que conseguimos uma proposta muito boa.
No Centro Oeste a maior preocupação foi de que a reforma trouxesse prejuízos financeiros muito graves. Este receio está afastado?
Está afastado. Tivemos muito cuidado com o Centro Oeste. Temos a consciência de que a balança de pagamentos da União está da forma que está devido à escala e a capacidade de produção e a competitividade do produto agro-indústrial brasileiro. Portanto, não tínhamos o direito de criar nenhum tipo de obstáculo que prejudicasse esta realidade. Pelo contrário, nosso objetivo foi o de criar mecanismos que fortalecessem esta situação. O tempo todo essa questão esteve presente. Nós conversamos muito com os senadores da região e os senadores de Mato Grosso do Sul tiveram uma participação grande neste processo. O Ramez, o Delcídio, o Juvêncio, deram sua parcela de contribuição. Discutimos com todos, e conseguimos, de certa forma, preservar o Centro Oeste, criando, inclusive, mecanismos que vão melhorar a atuação econômica da região. Em relação ao ICMS, tínhamos avançado um pouco mais, propondo uma alíquota para os produtos básicos que compõe os insumos agrícolas, mas tiramos isso pensando no Centro Oeste. Então, houve diálogo permanente. Não vejo nenhum tipo de ônus para a região.
Como ficam os municípios com a reforma tributária?
Além de relatar a reforma tributária, eu também fui relator da nova lei do ISS. A partir da modernização e ampliação da base tributária do ISS, as médias e grandes cidades já vão ter uma melhoria na base de arrecadação. Faltavam as pequenas cidades, aquelas que dependem do repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). São aqueles municípios que não têm arrecadação própria, que não têm as operações complexas que serão tributadas a partir do novo perfil de ISS. Esta reforma tributária focou muito este tipo de município. Procuramos melhorar o repasse do FPM, aumentando-o em um ponto percentual, o equivalente a pouco mais de R$ 1 bilhão. Além disso, demos aos municípios 25% da CIDE, do Fundo de Desenvolvimento Regional, e do Fundo de Compensação de Exportações. É claro que se você perguntar se é o ideal, se os municípios vão ficar em um mar de rosas, vou dizer que não. Mas, é um alento substancial. Este 1% do FPM será repassado todo mês de dezembro, na parcela do dia 10. Ou seja, será como um 13º para que eles possam pagar o 13º do servidor.
Como o Sr. vislumbra o Brasil a partir do momento em que a reforma seja aplicada na íntegra sobre o modelo tributário?
Na minha avaliação, em médio prazo, devido à facilidade de fiscalização, ao fim do pandemônio tributário, das alíquotas diferentes, quando tudo isso acabar e tivermos um modelo uniforme, estados e municípios terão ganhos de arrecadação por conta da produtividade e da facilidade na fiscalização, o que vai tornar a sonegação muito mais difícil. Vislumbro um país com mais facilidade de atuação por parte do setor produtivo, já que as pequenas e médias empresas, hoje, estão muito sacrificadas devido aos inúmeros procedimentos tributários que acabam onerando, complicando, e deixando o empresário vulnerável. É tanto imposto, tanta contribuição, tanto cálculo, que as empresas acabam não fazendo nada direito, sendo objeto de fiscalização. Este não é o objetivo do sistema tributário. Ele não foi feito para multar, mas para cobrar o imposto justo. Com a reforma, estaremos preparados para gerar mais empregos, para crescer, para desonerar a folha de pagamento. Hoje, ao invés de estimularem as contratações, os processos tributário e trabalhista desestimulam a geração de emprego. Além disso, com a implantação completa da reforma, teremos um sistema pronto para se relacionar com os mercados internacionais. Como poderíamos fazer parte da Alca com um sistema tributário antiquado?
Apesar dos pontos positivos ressaltados, alguns dizem que esta foi a reforma possível, e não a ideal. Como o Sr. analisa esta opinião?
Acho que a reforma foi além do que se esperava. Ela se iniciou com uma expectativa limitada e conseguimos melhorar muito o texto, inclusive o modelo, com a diminuição da carga tributária futura e com mecanismos mais modernos para avaliar a carga tributária. O que vai acabar baixando impostos. Os estados devem arrecadar o suficiente para manter sua máquina administrativa. Se as despesas diminuírem, a arrecadação também deve diminuir para que seja compartilhada por todos através da diminuição de impostos. Quem fala que a reforma não foi até onde deveria sãos setores que, na pressa de querer uma fatia maior do bolo, não raciocinaram que o Brasil é um país continental, com realidades diferentes e procedimentos em andamento que terão que ser uniformizados com prazos. Não tem como implantar a unificação do ICMS em um ano, o nível de insegurança nos Estados seria tão grande que melaria politicamente a reforma.
Quais foram as maiores dificuldades para a finalização do novo projeto tributário?
Ampliar os limites. Tínhamos limites financeiros do Ministério da Fazenda, que conseguimos superar com a ajuda da União, que abriu mão de receita para os estados e municípios. Tivemos que ampliar o limite político, já que no início PSDB e PFL estavam contra. Tivemos que atender também a base aliada, o PMDB fez uma série de reivindicações. Tivemos que tranqüilizar os governadores, mostrando que se tratava de um modelo que iria melhorar a vida dos estados, e não quebrá-los. Tivemos ainda que procurar um alívio para os municípios. No meio desta rede de interesses, de posturas legítimas, o segredo foi buscar o ponto de equilíbrio de cada um para que todos pudessem caminhar na mesma direção.
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