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quinta-feira, 5 de maio de 2011

O Capote e outras histórias – Nikolai Gógol

"Todos nós saímos de O Capote de Gógol", disse, certa vez, Dostoiévski referindo-se a influência do autor sobre sua geração de escritores russos. De fato, Gógol, que já teve resenhada aqui a obra Tarás Bulba, é fascinante.  Presente de meu amigo Cacho (que também alimentou minha bagagem literária com Bulba), li estes dias “O Capote e outras histórias”, coletânea da editora34 (organizada e traduzida diretamente do russo por Paulo Bezerra), reunindo, além do conto homônimo ao título, “Diário de um louco”, “O nariz”, “Noite de Natal” e “Viy”.

Diferentemente de Tarás Bulba, onde Gógol narra, com um toque épico, as aventuras e desventuras de um coronel cossaco nos idos do século 18, os cinco contos de “O Capote e outras histórias” navegam pelo fantástico.

Em “O Capote”, Akáki Akákievith, um funcionário de terceiro escalão das burocráticas repartições públicas kzaristas do século XIX se vê às voltas com a necessidade premente de adquirir um novo capote para protegê-lo do frio. Figura ridícula aos olhos dos colegas, triste aos olhos do leitor, Akáki passa por poucas e boas para adquirir seu novo casaco, vive breves momentos de glória com ele, acaba roubado, morre e ressurge como um fantasma a perseguir os bem aventurados proprietários de capotes luxuosos. Excelente conto.

Em “Diário de um louco”, novamente Gógol nos coloca frente a frente com um humilde burocrata que, apaixonado pela filha do chefe, enlouquece gradualmente diante dos olhos do leitor enquanto escreve em um diário suas reminiscências. Novamente, brilhante.

“O nariz” é uma história fantástica que tem início quando o barbeiro Ivan Yakóvlievitch encontra um nariz dentro de um pastel... O que já poderia ser um fato inusitado, vai as raias da fantasia quando o conto começa a narrar a saga do vaidoso assessor de colegiado (um entre a miríade de cargos da burocracia russa) Kovaliov em busca de seu nariz. Incrível a imaginação de Gógol e as peripécias por ele criadas. Tão fantástica é a histórias, que assim o autor a finaliza: “Digam o que quiserem, mas histórias semelhantes acontecem pelo mundo; raramente mas acontecem”.

Em “Noite de Natal”, Gógol continua na mesma linha fantástica narrando a história do ferreiro de uma pequena aldeia e sua paixão por uma linda e coquete jovem apaixonada pela própria beleza. Simples, se não fossem os toques surrealistas envolvendo bruxas, acontecimentos bizarros e o próprio diabo. O conto é repleto de momentos baseados na mitologia e crendice ucraniana.

Finalmente, em “Viy”, Gógol nos leva a uma surpreendente viagem pelo misticismo. “Viy é uma criação colossal da imaginação popular. É o nome que os ucranianos dão ao rei dos gnomos, cujas pálpebras chegam ao chão. Toda essa história é lenda popular. Por não querer submetê-la a qualquer modificação, narro-a quase com a mesma simplicidade com que a ouvi contar.”, diz o autor. O conto – um prato cheio para uma adaptação ao cinema – relata a apavorante história de um seminarista que se vê diante de uma missão épica contra o além.

O autor

Nikolai Vassílievitch Gógol nasce em 1809, na província de Poltava, atual Ucrânia. Em 1829 muda-se para São Petersburgo e logo publica Serões numa granja perto de Dikanka, reunião de contos inspirados no folclore de sua terra natal. Em 1835 publica mais duas coletâneas: Arabescos e Mírgorod, nesta última incluída a novela Tarás Bulba. No ano seguinte estreia O inspetor geral, sua peça teatral de maior sucesso. Em 1842, após viajar pela Europa, publica a primeira parte do romance Almas mortas. Nesse mesmo ano publica a novela O capote, que exerceria enorme influência sobre diversos escritores russos. Após um período de graves crises existenciais, destrói o manuscrito da segunda parte de Almas mortas, adoece gravemente e, sofrendo constantes delírios, falece em março de 1852.

1 comentário:

Anónimo disse...

Olá! Faz muito tempo, li um conto do Gogol em que a personagem principal - se não me engano, um homem que enriqueceu - pede a "especialistas" que lhe indiquem uma lista dos maiores livros já escritos, a fim de lê-los e "ficar culto". Passam-lhe a tal lista e o homem começa a ler as obras, mas... que decepção! Uma delas co
nta a história de um doido que passa vinte anos tentando voltar pra casa e pra mulher; no outro, uma mulher, bem casada com um médico, fica namorando uns bandidinhos, etc. E conclui: se isso é o melhor, prefiro ser ignorante! Alguém sabe o nome desse conto, e onde encontrá-lo, etc.? Grata