Semana On

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Ezra Nawi e o totalitarismo israelense

Em recente artigo publicado no jornal The Nation (29 de junho) o ativista israelense Ezra Nawi fez um veemente protesto contra sua condenação - foi considerado culpado de agredir dois policiais em 2007, enquanto lutava contra a demolição de casas palestinas em Um El Hir, na parte sudoeste da Cisjordânia - e denunciou uma campanha de perseguição patrocinada pelos colonos sionistas, pela polícia e exército israelenses com o apoio do sistema de justiça do país. No próximo dia 16, ele será sentenciado. Uma campanha internacional já reuniu cerca de 140 mil cartas de repúdio à decisão da justiça de Israel. Entre os signatários, gente do porte de Naomi Klein, Neve Gordon e Noam Chomsky. Confira o artigo.

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Meu nome é Ezra Nawi. Sou um cidadão judeu de Israel.

Serei sentenciado após ter sido considerado culpado de agredir dois policiais em 2007 enquanto lutava contra a demolição de casas palestinas em Um El Hir, localizada na parte sudoeste da Cisjordânia.

Obviamente, os policiais que me acusam de agressão estão mentindo. De fato, esta tem sido uma conduta comum à força policial e militar israelense assim como entre os colonos judeus.

Após cerca de 140 mil cartas enviadas às autoridades israelenses em suporte as minhas atividades nos territórios ocupados da Cisjordânia, o Ministro da Justiça respondeu dizendo que eu “provoquei os moradores locais”.

Esta resposta reflete a estratégia quem tem dominado o discurso oficial relacionado aos Territórios Palestinos Ocupados.

No fim das contas, fui eu quem envenenou e destruiu os poços de água palestinos?

Eu agredi idosos?

Eu envenenei os rebanhos de ovelhas dos palestinos?

Eu demoli suas casas ou destruí seus tratores?

Eu bloqueei estradas e restringi sua movimentação?

Fui eu quem proibiu que as pessoas conectassem suas casas a rede de eletricidade e água encanada?

Eu proibi os palestinos de construírem casas?

Nos últimos oito anos, vi com meus próprios olhos centenas de abusos como estes e os expus ao público. Ainda assim sou considerado um provocador. Posso dizer apenas que tenho orgulho em ser um provocador.

Por eu ser um provocador, a polícia e seus aliados me ameaçaram, espancaram e encarceraram em diversas ocasiões. E quando, ainda assim, eu continuei “provocando”, eles não hesitaram em me classificar como gay, em espalhar rumores de que eu teria o vírus da AIDS entre os palestinos com quem trabalho.

Por ser um judeu Mizrahi (descendente de comunidades judaicas no mundo árabe e muçulmano), gay e encanador, não pertenço a elite da sociedade israelense, não ostento o estereótipo dos pacifistas israelenses (intelectuais de descendência Ashkenazi). Os policiais - que constantemente me prendem - e eu somos parte do mesmo estrato social. Eu fui programado como eles, temos sotaques parecidos, conheço sua gíria, nosso passado é comparável. E, portanto, aos seus olhos estou “do outro lado”, o lado dos palestinos.

Este simples fato parece perturbá-los tanto que eles têm que me acossar. É a única forma pela qual seu modo de ver o mundo possa continuar fazendo sentido. Eu os ameaço precisamente por minar as categorias e estereótipos a partir dos quais eles compreendem o mundo.

Mas, os policiais não são os únicos atores neste palco. Os militares, a administração civil e o sistema judicial trabalham com a polícia e, juntos, seguem o comando de seus mestres, os colonos judeus.

Esta aliança ímpia é extremamente perigosa, pois para ela os fins – obter controle total sobre as Terras de Israel – justificam os meios. Com o objetivo de atingir este fim, eles desumanizam os palestinos e, por não considerarem os palestinos humanos, tudo é permitido.

Eles podem roubar suas terras, demolir suas casas, roubar sua água, aprisioná-los sem razão, e às vezes, até mesmo matá-los. Em hebreu nós dizemos damam mutar, tomar seu sangue é permissível.

É importante ter em mente, no entanto, que o mal que eu confronto diariamente na Cisjordânia não poderia ser mantido sem o sistema judicial israelense. A juíza Eilata Ziskind não apenas errou ao me julgar culpado, mas instruiu a corte a convidar um tradutor para a sentença, como se eu não falasse hebreu. Para ela, um judeu Mizrahi é um palestino árabe – e árabes são, quase que por definição, culpados. Meu caso é apenas parte deste padrão. Todos os crimes cometidos pelo estado e seus próceres nos territórios nos últimos 40 anos foram feitos kosher pelas cortes israelenses. Portanto, as cortes são tão culpados quanto os demais pela manutenção da crueldade.

Por eu ser um provocador, o estado me condiciona a um constante assédio, e ainda assim eu persisto. O que me fortalece e me dá energias é o heterogêneo e constante apoio que sempre recebi de aliados políticos. Quando fui espancado por colonos, quando meu carro foi roubado, enquanto estive preso, nunca me senti só. Sei que milhares de pessoas, tanto em Israel quanto em outros lugares, apóiam o que nós do Ta'ayush (Parceria Judaico-Árabe) estamos fazendo contra a ocupação.

"Ezra" em hebreu, significa socorro, e eu sei que em tempos atribulados posso contar com o socorro de meus amigos.

2 comentários:

BAR DO BARDO disse...

Que história...

Adriana Godoy disse...

São uns caras como ele que fazem a diferença e que fazem ainda acreditar. Bj