Semana On

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Qual é o Valor do Conhecimento?

Stephen Kanitz

O ESTADO DE SÃO PAULO publica anúncio de página inteira, com os seguintes dizeres:

"Qual É O Valor Do Conhecimento?
A Informação Está Em Todo Lugar. Se Hoje Em Dia A Informação É De Graça: Qual É O Valor Do Conhecimento?"

É uma excelente discussão, especialmente para quem pretende escolher a profissão de jornalista no próximo vestibular.

De fato, a informação está em todo lugar. Está em blogs de economistas, advogados, professores, de empresas como a Petrobras, nas associações de classe.

Obama fez uma campanha em que as informações de seu Twitter passavam diretamente dele para os seus eleitores, sem ter a imprensa como intermediária. Tal fato reduziu, e muito, o poder da imprensa sobre os políticos americanos.

Políticos brasileiros há uns 25 anos descobriram este poder de intermediação (e de distorção) que a imprensa fazia das propostas do candidatos, e passaram a ter veículos de imprensa próprios, como rádios e TVs. Assim, Sarney governou dando concessões de rádios e TVs aos políticos em troca da aprovação de leis necessárias. ACM, Collor de Melo etc. e etc. eram (e são) donos de TV e jornais.

A imprensa escrita sofre há 20 anos a concorrência do jornalismo de TV, que é mais rápido e grátis.

Como pode O Estado de São Paulo concorrer com os telejornais, que oferecem a mesma informação grátis (basta ligar a televisão)?

Como os jornalistas podem concorrer com prêmios Nobel como Paul Krugman, que supostamente entendem muito mais de economia do que qualquer jornalista?
É um problema sério para qualquer futuro jornalista.

Aqueles que geram conhecimento não precisam mais da imprensa para transmitir tal conhecimento à sociedade. Basta abrir um blog e colocar as palavras-chave ou assunto. Depois, o Google te acha.

Melhor: se você der uma entrevista a um jornalista (e ele nem sempre escreve o que você disse), você pode preservar para sempre tal entrevista no seu blog, enquanto o jornal só fica nas bancas por um único dia.

Ainda existe uma saída para o jornalista, e eu até participei de uma mudança positiva no jornalismo brasileiro, algo inédito até então, e que acredito seja a solução.
Criei na revista Exame o banco de dados das 1000 maiores empresas brasileiras. Criamos conhecimento, publicávamos as melhores empresas, os benchmarks, as fórmulas de sucesso. Criávamos nós mesmos o conhecimento que estávamos publicando. A Exame pagou pelo conhecimento gerado, em vez de obtê-lo de graça dos entrevistados.

A Folha criou depois o Datafolha, com o mesmo objetivo: criar conhecimento.

A saída, como insinua o Estadão, é você pagar pelo conhecimento. E, provavelmente, terá de pagar caro. Terá de criar no jornal um conhecimento que ninguém mais tem, como fiz por 25 anos na Revista Exame, criando análises exclusivas sobre a economia brasileira, sob o ângulo do administrador. Tais análises eram aguardadas todo ano: sucesso de banca por 25 anos.

Assim sendo, talvez a escola de jornalismo não seja a melhor opção, mas sim uma escola que ensine conteúdo: seja de sociologia, política, economia ou administração -- uma das várias ciências ou assuntos que seu futuro jornal cobrirá. E criar um núcleo de pesquisas, como fizeram a Folha e a Revista Exame.

É algo para se pensar.

8 comentários:

Guilherme disse...

Assim sendo, talvez a escola de jornalismo não seja a melhor opção, mas sim uma escola que ensine conteúdo: seja de sociologia, política, economia ou administração -- uma das várias ciências ou assuntos que seu futuro jornal cobrirá. E criar um núcleo de pesquisas, como fizeram a Folha e a Revista Exame.

Mas assim a informação deixaria de ser jornalística e passaria a fazer parte de outro campo de conhecimento, não? Sim, porque eu entendo que jornalismo não é ser especialista, mas traduzir a informação especializada numa mais "geral". Não é isso? E quem é capaz de fazer todo esse investimento numa única área de conhecimento (um curso de graduação, como você sugeriu) se não se sabe aos, sei lá, 17 ou 23 anos, qual área você irá cobrir ou pelo menos se vislumbra o jornalismo como profissão? Quem é tão devoto ao jornalismo a esse ponto de parar, sentar e planejar os proximos 15 anos?

Não entendo, Barone, não entendo o jornalismo como ser dono de um conhecimento específico e se destacar por isso. Não é a realidade que eu vi. Talvez seja ter o domínio sobre determinada área, mas não como um Nobel da economia, que fala, fala e o João da esquina não entende... Em 2008 entrevistei um Nobel em Química que falava sobre a síntese proteica da ubiquitina no combate ao câncer. Um artigo dele seria incompreensível num jornal, tanto que os repórteres mais antigos nem deram muita bola à presença dele no evento justamente porque o que ele ia falar não teria muita utilidade no sentido que simplesmente as pessoas não compreenderiam como uma proteína curaria câncer. Pegaram as falas, sentaram, "traduziram" e estavam com a informação que queriam: ubiquitina é uma proteína que está sendo usada na fabricação de remédios e os resultados tem sido animadores...

Dado o exemplo, não significa que você não tenha razão quanto aos núcleos de pesquisa. O jornal O Povo, de Fortaleza, também produz material semelhante, inclusive anuários e almanaques disputadíssimos no Ceará, no qual não tive oportunidade de trabalhar, mas sei das cifras que geram para as empresas. Acho que, no tocante a esse tipo de informação especializada, vale ter consultores nas redações. Mas não entendo que o futuro da informação seja concetrado na mão dos especialistas - a não ser que eles escrevam muito bem.

Adriana Godoy disse...

Essa discussão é boa...afinal, o que é conhecimento? Informação é uma coisa apreensão e aprofundamento do saber é outra. Sei que o homem aos trancos e barrancos se adapta a seu tempo e de alguma forma se aprimora. Os meios que o levam a esse aprimoramento são muitos e saber extrair o verdadeiro néctar é um aprendizado que pode levar uma vida. Barone, gostei. Beijo.

Barone disse...

Olá Gui,
este artigo não é meu, mas de Stephen Kanitz.

Mas vou opinar sobre.

A especialização no Jornalismo é uma opção, não uma paneceia para o problema. Alguns países europeus adotam esta medida. O sujeito se gradua em determinada área do conhecimento e, então, faz um curso de pós graduação em Jornalismo.

Particularmente considero uma opção melhor do que a exigência do diploma específico. Ocorre que o jornalista, para “traduzir a informação especializada numa mais ‘geral’”, precisa, necessariamente, dominar (ao menos nos fundamentos básicos) o assunto do qual está tratando. Será que a idéia de que cabe a nós apenas traduzir os especialistas para uma linguagem mais clara não é um dos motivos pelos quais os jornalistas da atualidade navegam em águas rasas do conhecimento? Estão sempre dando pitaco em assuntos que não dominam a fundo, alvos fáceis dos “experts” que, tendo como interlocutores gente que não se aprofunda em nada, nadam de braçada usando a mídia como instrumento. Tem coisa mais irresponsável?

Ainda assim, meu posicionamento é pela total liberdade na profissão. Acho que o Jornalismo deve ser exercido por gente que apostou a vida toda em sua formação cultural, e aí é importante dizer que formação cultural não se restringe a educação formal. Penso, ainda, que esta postura e forma alguma exclui os cursos de Jornalismo. Se eles forem bons, se prepararem profissionais dando-lhes uma sólida base em história, sociologia, literatura, empreendedorismo e nas novas tecnologias da informação, penso que cursar Jornalismo será algo válido e se traduzirá em um diferencial importante para quem optar por este caminho.

Deixei de lado, propositalmente, a formação ética. Ética não se aprende em um ou dois semestres. Esta balela absurda é uma das maiores irresponsabilidades cometidas pela academia e pelos sindicatos durante o debate (que debate?) que permeou este assunto. Ética se aprende vivendo.

Não sou dono da verdade (loas!), nem tenho soluções na ponta da língua. Torço para que, agora, trabalhemos para encontrar novos paradigmas para a profissão. Durante algum tempo, desavisados vão colocar nariz de palhaço e gritar palavras de ordem, professores e sindicalistas vão apostar no “mimimimi” típico de quem não tem propostas além do óbvio. Mas acredito que vamos caminhar para uma profissão melhor a partir de agora. O tempo será dono da razão.

Guilherme disse...

Ocorre que o jornalista, para “traduzir a informação especializada numa mais ‘geral’”, precisa, necessariamente, dominar (ao menos nos fundamentos básicos) o assunto do qual está tratando.

Claro, do contrário seria uma grande mediocridade (embora a gente veja isso todo dia). Mas o que eu defendo é que a própria profissão proporciona esse conhecimento, esse domínio, tanto para a fundamentação das próprias pautas como pelo interesse de cada profissional de manter-se atualizado em determinada seara de conhecimento (pele menos posso dizer que isso acontece comigo). Mas veja, Barone, eu entendo que obter esse conhecimento através de outras graduações é um grande exagero, a ponto de descaracterizar o jornalismo e transformá-lo em... em qualquer outra coisa que não seja jornalismo, em informação sem foco, não sei, não parei para pensar sobre isso, mas o argumento da especialização da maneira que é proposta muito me incomoda...

Eu percebi que o artigo não era teu, mas pensei que os dois últimos parágrafos eram teus comentários. De toda forma, sempre é válida a discussão. :)

(Ontem escrevi alguma coisa sobre esse tema no meu blog. Se tiver interesse, da uma olhada)...

Daniel Braga disse...

Barone, eu trabalho com informática e nós temos alguns jargões, sendo dois deles, o dado e a informação. O dado é a matéria-prima que precisa ser trabalhado de alguma forma para se tornar informação.

Acho que o cerce da questão é saber o potencial do seu público e trabalhar o dado para que se transforme em informação útil. Concordo que hoje grande parte dos jornalistas parecem adultos nadando em piscinas de bebês, arrotando mais do que digerindo realmente. Não sou da área jornalística e espero que não tenha ofendido ninguém pois não é esta minha intenção. Concordo com o seu ponto de vista mas o que o Gui falou tem seu fundamento e deve ser posto neste calderão quente.

A discussão está muito boa!

Barone disse...

Oi Gui,

temos uma discordância de opiniões. Eu não concordo de forma alguma que “a própria profissão proporciona esse conhecimento, esse domínio”, pelo menos não como regra. A maioria dos jornalistas que conheço, em especial os formados (salvo honrosas exceções), são marinheiros de águas rasas (usando novamente este figura de linguagem).

É claro, há jornalistas e jornalistas. Mas é humanamente impossível alguém dominar todas as áreas do conhecimento – mesmo que suas diretrizes básicas, embora haja muita gente que se considera capaz disso. É o complexo do super-homem, que cega a muitos colegas e os fazem sentir-se acima do bem e do mal.

O que é o Jornalismo para você? No que consiste o jornalismo?

Vou ao seu blog ainda hoje.

Volte logo para debatermos este e outros assuntos com uma gelada em mãos.

Ma disse...

Barone,

esse artigo veio em ótima hora. Eu acompanho seu blog há alguns meses e estava prestes a te mandar uma mensagem sobre esse assunto.
O vestibular vem aí e eu tenho certeza de que quero ser jornalista. Mas como o diploma não é mais necessário, convivo com a dúvida: será que eu deveria cursar outra coisa? Ciências sociais? Direito? Cursos que eu sempre pensei em fazer pelo conhecimento que poderia adquirir.
Se eu cursar jornalismo terá de ser em uma universidade que ofereça um curso muito bom.
Mas mesmo assim, a dúvida permanece.
Seria realmente muito bom se Jornalismo fosse uma especializaçao. :)

Daniel Braga disse...

Ma, acho que a sua dúvida deve ser a de milhões na véspera de um Vestibular. Fiquei pensando nas pessoas que já estavam certas em prestar o exame para Jornalismo, pois as dúvidas devem aparecer mesmo!

Barone, e qual seria o seu conselho meu amigo?