Semana On

terça-feira, 1 de julho de 2008

Melhor ser ladrão que viado

Paginando a Folha Online hoje, uma matéria me chamou a atenção com o título “Não quero filho gay, diz Isabeli Fontana no programa da Hebe”. Diz o lead da matéria: “A modelo curitibana Isabeli Fontana, 24, disse, nesta segunda-feira (30), que não gostaria de ter um filho gay. A declaração da ex-mulher do ator paulista Henri Castelli, 30, foi feita durante o programa "Hebe", exibido pelo SBT, em novo horário (20h)”.

Curioso, observei uma enquete feita pela Folha dentro da reportagem perguntando: Você concorda com a fala de Isabeli sobre o desejo de não ter filho gay?. Até as 09h25 desta terça-feira, 3.423 internautas haviam votado. Destes, 1.914 (56% do total) concordaram com a modelo. Ou seja, não gostariam de ter um filho gay. Outros 1.509 (44%) disseram não concordar com a opinião da jovem (mãe de dois filhos, um de 5 e outro de um ano de idade).

Saltaram aos meus olhos dois aspectos, um positivo, outro nem tanto. Constatar que 44% das pessoas que responderam a enquete respeitariam a sexualidade de seus filhos é algo a se comemorar. O resultado poderia ter sido pior. No entanto, ainda nos restam estes 56%, a maioria preconceituosa.

Há aqueles que podem argumentar: “Não é preconceito, apenas não gostaria que MEU filho fosse gay”. Não há preconceito maior sobre a sexualidade do que este. “Os outros podem, na minha família não”. É como os obtusos que sustentam não ser contra a união entre gays, desde que esta não seja oficializada. Ou àqueles que dizem não serem preconceituosos desde que os gays não expressem sua relação abertamente.

Curioso perceber que muitas vezes a sexualidade é vista com mais reservas do que a ética e a honestidade. Muitos destes 56% certamente gostariam de ver seus filhos ostentando cargos públicos, integrando Câmaras e Assembléias. Não teriam medo de que a ética e a honestidade de seus rebentos fossem destruídas pela máquina política que transforma homens em porcos. Afinal, melhor ser ladrão do que viado.

“A loucura que tomou conta do meu povo
anda nua pelas ruas
e gargalha dos que a reconhecem,
impotentes.”

12 comentários:

Alice Salles disse...

Gente, mas que coisa absurda...
A gente ainda tem muita a caminhar antes das pessoas poderes ser mais... HUMANAS!

Luiz Felipe Vasques disse...

Ao menos ela não se apóia em um discurso politicamente correto-padrão (fonte do novo "não se discute isso"). Apesar de preocupar o pensamento externado por alguém tão jovem (a moça tem somente 24 anos, correto? E eu aqui achando que velhas formas de se pensar morrem com gente velha), acho que ela merece pontos pela honestidade.

Sempre lembro dessas horas do ótimo "Adivinhe quem vem para jantar?", em que um sujeito, pensador liberal (Spencer Tracy), recebe a filha que foi há tempos para a faculdade, e queria apresentar o noivo que lá conheceu - um negro (Sdney Poitier). E ai vamos ver a teoria na prática... ;-)

De resto, não sei, véio. Acho que esses 56% gostariam, supondo que o fizessem, de ver seus filhos nas assembléias legislativas promovendo o bem comum, antes de pensar uma segunda vez que eles seriam devorados pela imoralidade institucional. Não acho, em suma, que eles NÃO se importariam em ver seus filhos se tornando corruptos, automaticamente.

Tathiane Panziera disse...

Ponto pra ela - pela sinceridade!
Como o amigo ai de cima disse, ela é jovem [e eu sou senil hehe] e ainda tem muito o que aprender. O que sei é que: A gente pede pela boca o que não quer. Ela deveria saber disso!

Barone disse...

Poizé Felipe. A medida do preconceito é diferente para cada um de nós. Resumindo, para mim, não há cabimento em julgar alguém pela cor ou pela opção sexual.

Luiz Felipe Vasques disse...

Eu tb acho que não, véio.

Mas a melhor opinião que eu vi a respeito disto acaba sendo, por increça que parível, em um episódio de South Park (sim, eles dão lições de moral vira e mexe arrebatatodras ao final), em que o chefe dos escoteiros-mirins da cidade é despedido por pressão dos pais por ser gay (o nome do personagem era Big Gay Al, por ai vc vê...) .

Isso vira escândalo nacional, aparece uma advogada toda engajada em direitos homossexuais, ele entra com um processo contra a tropa dos escoteiros-mirims dos EUA. Vence, ganha direito a não sei quantos milhões de dólares e os líderes são expostos em praça pública para execração, presos por aquelas tábuas medievais, que seguram os pulsos e as cabeças dos presos.

Ele se vira nesse momento para o público e diz que agradece todo o apoio, mas que abre mão da grana e pede que esses homens sejam soltos. Pq nenhuma corte de justiça, por mais que estabeleça que ele está certo, fará com que isto entre no coração de pessoas como aquelas, e é ser realmente aceito dessa forma - em seus corações - que ele terá que procurar atingir.

Então, pontos para a moça, pela sinceridade, sim. Vamos agora ver o que está acontecendo...

Daniel Braga disse...

É uma questão interessante Barone. Eu sou pai e não gostaria que meus filhos se tornassem homossexuais realmente mas tenho vários amigos e conhecidos homossexuais.

A vontade dos pais (no caso a minha) é na verdade um desejo. Penso no que faria se isto viesse a ocorrer e acho que aceitaria, do fundo do coração, mas não ficaria contente.

Andei lendo alguma coisa sobre ética por este dias e os pilares são baseados nas palavras:

Devo
Quero
Posso

A moral é como eu utilizo e aplico a ética. A moral muda com o tempo e mesmo o homossexualismo ainda sofre com ela e vai sofrer ainda muito até que o mundo retorne a uma visão grega clássica onde o homossexualismo era comum.

Será que o desejo de um pai pode ser criticado como hipócrita nesta questão? Estou fazendo a pergunta anão somente a você mas a todos e a mim mesmo.

Acho que a forma como este pai agirá no futuro é que poderá ser criticada e não seu desejo presente.

Mas estou refletindo sobre a questão!

Barone disse...

Penso que todos nós temos o preconceito entranhado em diferentes níveis de intensidade. É inevitável, face ao bombardeamento de informações pré-concebidas do que é ou não aceitável que recebemos desde o berço até o último suspiro. No entanto, considero que o que diferencia as pessoas neste aspecto da convivência social é a consciência do erro. Identificar o preconceito e combatê-lo diariamente separa alguns indivíduos dos demais. No meu caso, procuro me enquadrar neste nicho. Cresci em uma família que nunca permitiu que cor ou opção sexual fossem vistas com reservas, como desqualificação, erro ou pecado. Portanto, me incomoda ao extremo este tipo de postura.

Não considero que a mocinha tenha sido feliz ao expressar seu preconceito como vocês disseram. Aliás, me assusto um pouco com esta visão. Teria Hitler “acumulado pontos” por expressar abertamente seu racismo? Teria Mao “acumulado pontos” por expressar abertamente sua visão monolítica da cultura? Teria Fidel “acumulado pontos” ao deixar claro que a liberdade de expressão não é mais ou tão importante quanto a oferta de saúde para todos? Seriam muitos os exemplos e para mim não há limite aceitável para exclusão baseada em opção sexual ou de cor.

Sobre a relação pais e filhos, apesar de não tê-los não me furto de opinar. Acho natural que os pais temam pelo futuro dos filhos. Nenhum pai quer ver o filho sofrendo, passando por dificuldades. Para os pais, nada melhor do que um filho enquadrado, pois o enquadramento gera menos conflitos sociais, menos atritos, mais chances de “ser feliz”.

Mas a história da civilização humana não foi construída por pessoas enquadradas. Pelo contrário. Se o homem se desenvolveu nestes 10 segundos do calendário cósmico em que escrevemos nossa história foi devido a coragem dos que quebraram paradigmas, dos que ousaram, dos que desafiaram e não pela conformação dos que se sentaram balançando a cabeça em concordância com o status quo.

Além disso, devemos nos perguntar: me sentiria desconfortável com um filho gay pois isso traria dificuldades para a sua vida ou porque não admito que ele (ou ela) tenha uma opção sexual diferente do que impõem os costumes sociais e religiosos?

O fato é que temos a obrigação de sermos felizes. Se esta felicidade passa por uma opção sexual diferente da nossa, que direito temos de criticar e impor limites? E mais. Aceitar as diferenças é um exercício diário e não se atém apenas “aos outros’ mas, principalmente, aos que estão a nossa volta. Sem esta visão, abre-se as portas para todos os tipos de totalitarismos.

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

tenho dois filhos e só quero que eles sejam felizes e que ajudem a construir novas culturas, novos valores, novas relações humanas, baseadas no respeito, na solidariedade e livres de todos os preconceitos e desigualdades que impedem a humanidade de ser feliz, quebrando os muros do ódio, da opressão, da discriminação e da exclusão...e que vivam o amor pleno....e, como disse Maiakóvski, "brilhar como um farol, brilhar com brilho eterno, Gente é pra brilhar que tudo o mais vá prá o inferno, este é o meu slogan e o do sol" ...e que vão para o inferno as bobagens que a gente escuta de muitos artistas globais, manequins, políticos e tais celebridades ...

Luiz Felipe Vasques disse...

[i]Não considero que a mocinha tenha sido feliz ao expressar seu preconceito como vocês disseram. Aliás, me assusto um pouco com esta visão. Teria Hitler “acumulado pontos” por expressar abertamente seu racismo? Teria Mao “acumulado pontos” por expressar abertamente sua visão monolítica da cultura? Teria Fidel “acumulado pontos” ao deixar claro que a liberdade de expressão não é mais ou tão importante quanto a oferta de saúde para todos? Seriam muitos os exemplos e para mim não há limite aceitável para exclusão baseada em opção sexual ou de cor.[/i]

Há certos limites nessa comparação, meu velho: a mocinha não é Hitler, Mao ou Fidel -- ou ao menos não ainda. ;-)

Ainda acho que o ponto aqui passa a ser pensar o que leva alguém tão jovem, e em uma carreira direta ou indiretamente ligada a um meio que trabalha com sensibilidade e criatividade, pensa assim. Na hora em que a tal mocinha tiver uma atitude de "viva e deixe viver - mas longe do meu filho" para "não é assim que se pode viver" ai teremos um big fucking problem nas mãos.

Até lá, ela é a ovelha desgarrada do rebanho, é o coração a ser conquistado do Big Gay Al.

Leonam disse...

Adorei, e estou adorando o que estou lendo até agora, primeira discussão em um blog em que vejo respeito pelas opiniões dos outros. Fico feliz de ainda encontrar e ler coisas mesmo com alguns pontos diferentes dos outros mas com muita inteligencia e argumentos. Até o que um pai ai falou, do seu desejo de hoje, e de seu comportamento de amanha. Penso que sobre isso pode haver um não querer que o filho sofra com o mundo e seus preconceitos, mas se não existisse esse preconceito? Será que isso seria aceito de boa pelo pai?
Filho chega em casa e fala para o pai: Pai, este é Ricardo meu namorado, nos amomos muito.
Meu comentario não foi preconceituoso, e sim tentando entender e sentir o que um pai ai disse, e até concordo com ele, e lhe dou os parabens, por esta tentando entender e melhorar seus pensamentos.

No mais parabens Barone, e para todos aqui que estao a dialogar sobre esse tema que ainda vai dar pano pra chão hehehee. Abraço pra todos.

Olegas disse...

A moral muda, mas não apenas como resultado da mudança do tempo. A moral está essencialmente ligada às diferenças sociais, entre elas de classe, grupos sociais específicos, religião, sexualidade, etc.
Ter filhos homossexuais, em nossa sociedade, é uma garantia de conflitos. Creio que é esse medo de se expor que leva a muitas pessoas a rechaçar publicamente o homossexualismo. Afinal, é sempre mais fácil externalizar os sentimentos.
No meu caso, não me importaria em ter filhos(as) homossexuais, desde que eles(as) se sentissem felizes com essa opção.

Dan Jung disse...

Realmente aí reside uma certa ferida narcísica. No entanto, a revelação da modelo pode estar refletindo uma grande mágoa. Talvez algo que ela tenha vivido fortemente e ainda não tenha superado... ou quem sabe, entre as várias trocas de roupas ela ainda não tenha utilizado as regiões complexas do seu cérebro. É melhor dá um desconto para a criatura...